Política Brasília

Programa de partido 'soberanista' de Bolsonaro trata aborto como 'traição social'

Evento é realizado em hotel de luxo em Brasília, próximo ao Palácio da Alvorada
O presidente Jair Bolsonaro discursa no lançamento do partido 'Aliança Brasil' Foto: Reprodução/Facebook
O presidente Jair Bolsonaro discursa no lançamento do partido 'Aliança Brasil' Foto: Reprodução/Facebook

BRASÍLIA — Lido na primeira convenção nacional do Aliança pelo Brasil, o programa do partido que o presidente Jair Bolsonaro tenta criar define a legenda como "soberanista", que refuta as "falsas promessas do globalismo", e trata o aborto como "uma traição social". A justificativa é que todos que defendem a interrupção da gestação já nasceram. O evento ocorreu em um hotel de luxo em Brasília, nas proximidades do Palácio da Alvorada, na manhã desta quinta-feira.

— Em 2018, o povo deu o norte da nova representação política que buscou ao sair às ruas, baseada na verdade, na sinceridade e na conservação dos valores fundamentais da alma brasileira — leu a advogada Karina Kufa, uma das idealizadoras do partido.

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— Agora, em 2019, um novo passo precisa ser dado: o da criação de um partido político que dê voz ao povo brasileiro, que garanta a ele efetiva representatividade e que esteja em consonância com os anseios populares; um partido político conservador, comprometido com a liberdade e com a ordem, e que possa servir ao povo brasileiro como um instrumento seguro para a repercussão de sua voz, para a sua plena representação e para a realização de sua vocação, em harmonia com as tradições históricas, morais e culturais da nação brasileira; um partido político soberanista, comprometido com a auto-determinação, e não com os objetivos e com as falsas promessas do globalismo — acrescentou.

O programa da legenda repudia o aborto " sob todas as suas formas" destacando que é uma " cultura da morte". "O assassinato deliberado de uma criança inocente e indefesa é a inversão absoluta da ordem, pois o valor da vida é relativizado e os mais frágeis se tornam os mais violentados, ao invés dos mais protegidos", diz o texto.

O partido em criação Aliança pelo Brasil será comandado pelo presidente Jair Bolsonaro e terá o senador Flávio Bolsonaro, seu primogênito, como vice-presidente. A executiva foi anunciada em evento na manhã desta quinta-feira, em um hotel de luxo de Brasília. Completam a cúpula da legenda o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Admar Gonzaga, que será o primeiro-secretário, e a advogada Karina Kufa, para a tesouraria.

A comissão provisória de trabalho do partido é integrada por outras 11 pessoas, entre eles o filho homem mais novo do presidente, Jair Renan Bolsonaro, e dois assessores do seu gabinete no Palácio do Planalto, Sérgio Rocha Cordeiro e Tércio Arnaud.

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Assessor do deputado Eduardo Bolsonaro, Carlos Eduardo Guimarães também está no grupo.

Programa tem cinco tópicos

Com dez páginas, o programa é dividido em cinco tópicos que o partido respeita: Deus e religião; memória, identidade e cultura do povo brasileiro; vida, legítima defesa, família e infância; garantia da ordem, da representação política e segurança; e defesa do livre mercado, da propriedade privada e do trabalho.

Na parte sobre legítima defesa, o documento afirma que o partido vai lutar "incansavelmente até que todos os brasileiros possam ter plenamente garantido seu direito inalienável de possuir e portar armas, para sua defesa e a dos seus, bem como de sua propriedade e de sua liberdade". O tema surgiu na introdução do programa, com a referência ao referendo de 2005 sobre a comercialização de armas, cujo resultado foi "ignorado pelo estamento burocrático", segundo o novo partido.

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Há ainda inúmeras menções a Deus e ao cristianismo, que dão ao texto um forte tom religioso. "A relação entre esta Nação e Cristo é intrínseca, fundante e inseparável", diz um trecho. "O partido toma como seus os valores fundantes do Evangelho e da Civilização Ocidental, herdeira do virtuoso encontro entre as cidades de Jerusalém, de Atenas e de Roma, ciente de que o povo brasileiro acredita que Deus é o garantidor do verdadeiro desenvolvimento humano, pois a dignidade da pessoa humana advém do fato de todos os concidadãos brasileiros serem filhos de Deus, dotados por Ele de direitos inalienáveis", aponta outro.

O fato de o primeiro ato oficial celebrado em terras brasileiras ter sido uma missa e de alfabetização primária ter ficado a cargo de ordens religiosas foi lembrado no documento. O partido defende ainda que a laicidade do Estado nunca significou "ateísmo obrigatório --como ocorre nos regimes totalitários que perseguem a religião".

'Bandidos munidos de canetas'

Um dos tópicos do programa do Aliança pelo Brasil prega o combate ao que chama de "ativismo judicial" e "bandidos que estejam no poder - munidos de armas ou de canetas". O documento também defende a limitação do Poder Judiciário. As observações são feitas dentro da exposição da legenda sobre garantia da ordem, da representação política e da segurança. O texto foi apresentado na manhã desta quinta-feira durante convenção realizada em um hotel de luxo em Brasília.

"Nenhum país poderá se dizer próspero e fundado sobre a justiça enquanto bandidos estejam no poder – munidos de armas ou de canetas. Por isso, a Aliança pelo Brasil presta seu compromisso com a garantia da ordem: não apenas a ordem pública e social, mas também a ordem moral e jurídica", diz o texto.

O partido se comprometeu a se empenhar para criar "um ambiente de segurança jurídica no Brasil", com a garantia de segurança dos contratos e previsibilidade das ações do Poder Público. E, ainda nesse tema, faz críticas a integrantes do Judiciário, sem citar nenhum nome.

"É imprescindível, aliás, o combate ao chamado “ativismo judicial”, fenômeno de usurpação do poder legislativo, e de violação à separação dos poderes, por meio do qual é desrespeitada a legítima vontade popular exercitada diretamente ou por meio de seus representantes eleitos, inclusive, através de seus silêncios, quando o povo ou seus representantes decidem não legislar sobre algo ou rejeitar proposta legislativa sobre algum tema", aponta o programa.

Poder ao povo

Segundo o texto, o novo partido vai se esforçar para combater esse ativismo buscando "mecanismos de restabelecimento da autoridade dos Poderes usurpados frente a qualquer iniciativa nesse sentido". Como exemplo, o documento aponta eventuais mecanismos de suspensão de atos judiciais que invadam competências legislativas.

O programa também diz que ordem jurídica "exige o controle da burocracia estatal, seja ela executiva, legislativa ou judiciária" e que o partido vai apoiar medidas para extinguir órgãos burocráticos, conselhos, comitês, grupos de trabalho, comissões ou coletivos que realizem regulação e controle de matérias importantes sem o necessário debate democrático e legislativo.
Em aceno ao Congresso, o objetivo apontado com a iniciativa é diminuir "o poder excessivo que hoje possuem os burocratas não-eleitos, devolvendo esse poder ao povo, seu titular, que o exerce diretamente ou através de seus representantes".

O texto ainda cita pleitos da manifestações deflagradas em junho de 2013, "a garantia efetiva e real da representação popular", para justificar a medida. "Afinal, um dos requisitos para legitimidade de qualquer poder é sua limitação". Já com relação à ordem moral, a legenda se compromete a conservar "valores cristãos, da memória e da cultura brasileira".