Por Brenda Ortiz e Marcelo Valadares, G1


O Ministério da Educação (MEC) divulgou nesta terça-feira (18) um programa de alfabetização chamado Tempo de Aprender. Ele é voltado para formação de professores, reestruturação de material didático e aplicação de um teste nacional em alunos em fase de alfabetização, entre outras medidas. De um modo geral, a adesão às iniciativas do Tempo de Aprender serão voluntárias: cada rede municipal ou estadual poderá decidir se vai oferecer as ações do programa em suas escolas.

Na apresentação do programa, que não contou com a abertura de perguntas feitas pelos jornalistas, o secretário de Alfabetização do MEC, Carlos Nadalim, disse que o foco do programa são os professores do último ano do ensino infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental. O Tempo de Aprender é segunda ação da Política Nacional de Alfabetização, que já tinha lançado o “Conta pra mim”, que incentiva pais a lerem para os filhos.

Durante a apresentação do programa, em Brasília, o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou que os resultados da alfabetização no Brasil não são bons e que o ministério tem sentido "preconceito" sobre os novos métodos adotados pelo governo.

"Estamos trazendo técnica de uma forma aberta. Não estamos impondo nada, mas sentimos um preconceito. Eu peço um gesto de boa vontade a todos para estarem abertos a ouvirem técnicas que trouxemos lá de fora, para melhorar a alfabetização no Brasil" - Abraham Weintraub, ministro da Educação

Fachada do Ministério da Educação, em Brasília — Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

O Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) divulgou nota na qual afirma receber com "cautela e preocupação" as ações propostas no programa.

"Além das incertezas geradas pelo caráter ainda genérico das informações apresentadas, o Consed avalia que a alfabetização tem sido, até aqui, o principal fator impulsionador do regime de colaboração construído entre estados e municípios" - Consed

O Conselho propõe que o programa seja mais debatido com os Estados e municípios, "que o papel de articulador dos estados seja valorizado e potencializado; que eventuais adesões ao programa sejam feitas primeiramente pelos sistemas, sem limitações à prerrogativa dos estados e municípios escolherem ações que possam complementar políticas já em curso em seus respectivos territórios; e, sobretudo, que as políticas já implementadas não sofram reveses ou concorrências de qualquer natureza", conclui a nota.

João Marcelo Borges, diretor de Estratégia Política do Todos Pela Educação, afirmou ao G1 que houve demora na apresentação da política, mas a considera como um passo positivo.

"O programa 'Tempo de Aprender' e a Política Nacional de Educação são embasados em evidências científicas robustas, alinhadas às melhores práticas adotadas em boa parte de sistemas educativos de alto desempenho" - João Marcelo Borges, diretor de Estratégia Política do Todos Pela Educação

Borges ressaltou, porém, que o Todos pela Educação expressa a mesma cautela mencionada pelo Consed "relativa à necessidade de integrar melhor a iniciativa federal com os esforços que já vêm sendo feitos nos âmbitos dos Estados, sobretudo aqueles que iniciaram ou já têm desenvolvido, há muitos anos, estratégias em regime de colaboração para a alfabetização."

4 eixos do programa

O programa está construído em 4 eixos: formação continuada de profissionais da alfabetização; apoio pedagógico para a alfabetização; aprimoramento das avaliações da alfabetização e valorização dos profissionais de alfabetização.

Veja o que se sabe sobre cada um dos pontos:

1. Formação continuada de profissionais da alfabetização

O projeto do MEC prevê, neste eixo, três focos:

  • Formação prática para professores alfabetizadores: O MEC espera atender cerca de 300 mil professores em cursos on-line que começam no 1º semestre de 2020. O investimento previsto nesta ação é de R$ 3 milhões;
  • Formação prática para gestores educacionais: diretores escolares e coordenadores pedagógicos de alfabetização também poderão participar de cursos on-line. O investimento previsto é de R$ 1,5 milhão;
  • Intercâmbio de professores alfabetizadores: 50 professores participarão de curso na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP) e no Instituto Politécnico do Porto (IPP);

2 . Apoio pedagógico para a alfabetização

Neste eixo, três ações foram apresentadas:

  • Sistema On-line de Recursos para Alfabetização — Sora: É um sistema de plano de aulas desenvolvido pelo Laboratório de Tecnologia da Informação e Mídias Educacionais — LabTIME, da Universidade Federal de Goiás (UFG). Segundo o ministério, o Sora vai oferecer "recursos pedagógicos, como estratégias de ensino, atividades e avaliações formativas, com respaldo em práticas de alfabetização".
  • Apoio financeiro para assistentes de alfabetização e custeio para escolas: segundo o MEC, o programa vai fornecer recursos financeiros às redes de educação para apoiar a atuação dos assistentes de alfabetização, que auxiliam os professores no manejo da sala e para custear as despesas das escolas.
  • Reformulação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) para educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, segundo o MEC, objetivo vai ser adequar as obras literárias do Programa aos novos métodos e fundamentos adotados pelo Programa

3. Aprimoramento das avaliações da alfabetização

Neste eixo, o MEC afirmou que destinará um orçamento de R$ 20 milhões. Apesar de ter um orçamento, ainda não há explicações de como essas avaliações vão ser desenvolvidas e aplicadas.

  • Estudo Nacional de Fluência: o MEC propõe realizar um teste da fluência em leitura oral nas escolas que participarem do programa. A estimativa é avaliar 2 milhões de estudantes do 2º ano do ensino fundamental, ao custo de R$ 20 milhões. O objetivo, segundo o ministério, é oferecer às redes estaduais, municipais e distrital um indicador de desempenho em alfabetização e verificação da aprendizagem da leitura.
  • Aperfeiçoamento das provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) voltadas à alfabetização: o objetivo do MEC é que as provas do Saeb sejam capazes de avaliar os seguintes tópicos de avaliação da alfabetização dos alunos: aprender a ouvir, conhecimento alfabético, fluência em leitura oral, desenvolvimento de vocabulário, compreensão de textos e produção de escrita.

4. Valorização dos profissionais de alfabetização

No último eixo, o foco se baseia em premiar os profissionais da educação:

  • Prêmio por desempenho para professores, diretores e coordenadores pedagógicos: o objetivo, segundo o MEC, é estabelecer prêmios para reconhecer profissionais da educação que tiverem bom desempenho em alfabetização. A metodologia utilizada para avaliar qualitativamente estes profissionais não foi definida no documento apresentado. O texto diz, apenas, que: "O desempenho dos alunos do 2º ano do ensino fundamental será a principal métrica para a distribuição do prêmio, que será destinado a professores do 1º e 2º ano, diretores e coordenadores pedagógicos das escolas".

O que é a Política Nacional de Alfabetização?

A Política Nacional de Alfabetização é um decreto publicado em abril que prevê, entre outras mudanças, que o ensino infantil reforce as atividades de pré-alfabetização, e que haja esforço extra para concluir o ensino da leitura já no primeiro ano do ensino fundamental.

Entre os objetivos do decreto publicado está cumprir a meta 5 do Plano Nacional de Educação (PNE). A meta, que entrou em vigor em 2014 e tem vigência até 2024, diz que todas as crianças devem ser alfabetizadas até no máximo o final do 3º ano do fundamental, ou seja, aos 8 anos de idade.

A política também prioriza um método de ensino sobre os demais: o chamado método fônico, classificado no decreto como uma lista de "seis componentes essenciais para a alfabetização".

Segundo especialistas ouvidos pelo G1, a criação de uma política nacional de alfabetização é positiva, mas a priorização de um único método pode levar à padronização do ensino, e o risco disso é limitar tanto as possibilidades de os professores ensinarem, quanto as possibilidades de os alunos aprenderem.

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