Luciano Ferreira*

Nascida e criada no Complexo da Maré, militante dos direitos humanos, da igualdade de gênero e racial, a vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) foi brutalmente executada na noite de 14 de março de 2018, no Estácio, junto com o motorista Anderson Gomes que dirigia o carro em que estava. O assassinato a tiros da parlamentar e do motorista gerou enorme comoção no Rio e em outras cidades do país, além das redes sociais, levando multidões a protestar nas ruas. A hashtag #MariellePresente foi uma das mais mencionadas ao longo do dia do enterro da parlamentar, com 600 mil menções no Twitter.

Cerca de 50 mil pessoas foram às ruas no Rio e outras 30 mil em São Paulo em manifestações para repudiar os assassinatos e pedir Justiça. Uma espécie de força-tarefa foi montada reunindo as polícias fluminenses, Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e as Forças armadas para investigar o duplo homicídio.

A jovem vereadora, de 38 anos, deixou um legado àqueles que acreditam na promoção da igualdade e na prioridade que deve ser dada à educação no país. Após frequentar um pré-vestibular de uma ONG oferecido na Maré, Marielle Franco se formou socióloga na PUC-Rio e, depois, tornou-se mestre em administração pública pela UFF, chegando a coordenar a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Durante uma década ela foi assessora do deputado estadual Marcelo Freixo, do PSOL.

Eleita em 2016, Marielle obteve 46.502 votos e foi a quinta vereadora mais votada na capital fluminense. O Acervo O GLOBO listou 15 frases marcantes de Marielle, publicadas no jornal em entrevistas e artigos nos últimos anos, além de registros feitos nas redes sociais.

1) "As rosas da resistência nascem no asfalto. A gente recebe rosas, mas vamos estar com o punho cerrado falando de nossa existência contra os mandos e desmandos que afetam nossas vidas" - Em 08/03/2018, ao receber flores de um homem no plenário da Câmara dos Vereadores do Rio enquanto fazia um pronunciamento sobre o Dia Internacional da Mulher.

2) "Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?" - Em 13/03/2018, ao desabafar, em uma rede social, sobre a morte de mais um jovem em comunidades do Rio, dessa vez no Jacarezinho.

3) "De jeito nenhum (entraria para a política). Quero ser pesquisadora" - Quando ainda era assessora do deputado estadual Marcelo Freixo e ouviu de seu orientador de monografia, o professor da PUC-Rio Ricardo Ismael, que acabaria entrando para a vida pública.

4) "É preciso garantir que as favelas sejam também cidades. Já que elas estão por todo o município" - Em 19/09/2016, ao comentar suas propostas para o município durante a campanha eleitoral daquele ano, em entrevista ao GLOBO.

5) "É preciso romper com a naturalização do assédio no carnaval" - Em 13/02/2018, ao comentar os diversos casos de assédio sexual ocorridos durante o carnaval na cidade, em artigo publicado na seção de Opinião do GLOBO.

6) "Fiquei impressionada com a falta de cuidados nas indicações (às secretarias do Rio). Esse caso na área de direitos humanos não combina com a promessa do novo prefeito de cuidar das pessoas e fazer uma nova política" - Em 18/01/2017, ao criticar a nomeação de Arthur Fuks para a Subsecretaria de Inclusão Produtiva da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos, feita pelo prefeito Marcelo Crivella. Fuks foi afastado logo após a nomeação por postagens no Facebook com mensagens que não combinariam com a filosofia do órgão.

7) "Me proponho a atuar coletivamente para garantir direitos num espaço tão machista como o Estado" - Em 20/09/2016, durante a campanha eleitoral, ao comentar suas propostas para a Câmara dos Vereadores do Rio.

8) "Eu debato o feminismo no sentido mais amplo, de que esse governo do PMDB agride as mulheres diariamente, na defasagem de vagas nas creches, no caos do transporte público" - Em 04/10/16, ao comentar a agressão do então candidato à prefeitura do Rio Pedro Paulo (MDB) à sua ex-mulher Alexandra Marcondes.

9) "As ações (alteração nas atribuições da Guarda Municipal) deveriam ser para garantir melhores condições de trabalhos dos agentes, aumento de seus rendimentos e efetivos" - Em 09/01/2017, ao criticar a decisão do prefeito Marcelo Crivella de utilizar a Guarda Municipal nas ações de segurança na cidade do Rio, em artigo publicado na seção de Opinião do GLOBO.

10) "No Rio, já tivemos várias experiências de intervenções desastrosas, como a do Exército na Maré. Ela durou cerca de um ano, no período de Copa e Olimpíadas. Gastou-se R$ 600 milhões, um investimento enorme que poderia ser usado em políticas efetivas" - Em 19/02/2018, ao criticar a intervenção federal na segurança do Rio, em um post no Twitter oficial da vereadora.

11) "O general da intervenção disse que o Rio de Janeiro é um laboratório para o Brasil. E nós somos as cobaias?" - Em 27/02/18, ao criticar a intervenção federal na segurança do Rio, também em um post no seu Twitter oficial.

12) "O corpo negro é elemento central na reprodução de desigualdades. Está nos cárceres repletos, nas favelas e periferias designadas como moradias" - Em 01/12/2017, ao lamentar a situação da população negra no Brasil, em artigo publicado na seção de Opinião do GLOBO.

13) "Um dia (o prefeito Crivella) diz que vai cuidar, no outro dá rosas e no seguinte chega destruindo os quiosques onde trabalhadoras e trabalhadores tiravam seu sustento" - Em 10/03/18, ao criticar, em um post em seu perfil oficial no Facebook, uma ação de funcionários da Prefeitura do Rio, que removeram quiosques em praça da Vila Kennedy, Zona Oeste do Rio, onde o Exército fez operações.

14) "Fico muito indignada quando ouço essas histórias. Esquema de propina envolvendo transporte, saúde, moradia. É a vida da população em jogo, e esses mercenários só querem saber de dinheiro e poder" - Em 23/01/2018, ao comentar, em um tweet em sua conta oficial, um desdobramento da operação Lava-jato que prendeu o ex-secretário de Obras do Rio Alexandre Pinto da Silva.

15) "Que tal procurar em outras malas, que estão em mansões e helicópteros?" - Ao questionar o fichamento realizado pelo Exército de moradores da Vila Kennedy, no dia 23 de fevereiro de 2018, no início da intervenção militar na segurança do Rio, que, para a vereadora, "é uma farsa".

* estagiário sob supervisão de Gustavo Villela, editor de Acervo e Qualificação

Protesto. Plenário da Câmara dos Deputados: homenagem à vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no Rio

Protesto. Plenário da Câmara dos Deputados: homenagem à vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no Rio Michel Filho 15/03/2016 / Agência O Globo