Por Fernanda Calgaro e Elisa Clavery, G1 e TV Globo — Brasília


O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse nesta quarta-feira (29) concordar com a criação de uma quarentena extensa para que juízes e membros do Ministério Público disputem eleições para cargos públicos. A ideia foi levantada nesta quarta pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.

Para Maia, as carreiras de Estado “não podem ser utilizadas como trampolim pessoal”. Questionado sobre o prazo de oito anos, citado por Toffoli, Maia disse que será preciso debater o período exato da nova regra.

“Eu acho que o presidente Toffoli está correto, já existem projetos tramitando na Casa e acho que essa matéria está sendo amadurecida, está muito perto de chegar a um entendimento de que as carreiras não podem ser utilizadas como trampolim. A estrutura do Estado não pode ser utilizada como trampolim pessoal”, afirmou Maia.

Ainda segundo o presidente da Câmara, o tema poderá ser votado ainda neste semestre. Ao responder sobre a aplicação da regra nas próximas eleições federais, em 2022, Maia disse acreditar que até lá a matéria, certamente, estará "madura".

Dias Toffoli defende que juízes e promotores cumpram quarentena antes de se candidatar

Dias Toffoli defende que juízes e promotores cumpram quarentena antes de se candidatar

O presidente da Câmara ressaltou que o assunto já vinha sendo discutido na Casa há alguns anos, inclusive com previsão de ir a voto no primeiro semestre. O adiamento, disse, foi motivado pela pandemia do novo coronavírus.

Maia declarou que a proposta de uma inelegibilidade por oito anos representa um prazo "longo", mas que a opinião do presidente do STF, que "conhece a engrenagem do Poder Judiciário", deve ser ouvida.

"Eu acho que o presidente Toffoli conhece a engrenagem do Poder Judiciário muito melhor do que eu. Então, certamente, sabe o impacto e propôs oito anos. Oito anos são um prazo longo, são duas legislaturas, dois mandatos para que a influência de decisões que, muitas vezes podem ser distorcidas, influenciem o processo eleitoral", afirmou.

E acrescentou: "O presidente Toffoli conhece a política, trabalhou no parlamento, é um grande presidente do Supremo Tribunal Federal. Se faz a proposta, o parlamento deve ouvir a proposta do presidente Toffoli e decidir: pelos 8 anos, por 6 anos, por 4 anos. Aí é uma decisão do plenário [da Câmara]".

Reação na Câmara

O líder do Novo na Câmara, Paulo Ganime (RJ), disse que há risco de a proposta ser usada contra uma eventual candidatura do ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, que também atuou na magistratura.

"A gente tem sempre que se preocupar quando uma notícia dessa surge para que não seja uma pauta usada de forma casuística, ou seja, para prejudicar por exemplo o ex-ministro e também ex-juiz Sergio Moro. Se for esse o caso, é completamente absurdo”, disse.

O deputado defende a quarentena, mas com um prazo menor – três anos, por exemplo – e que não impacte aqueles que já saíram da magistratura. Além disso, acredita que a mudança não deve ser válida para as próximas duas eleições, em 2020 e em 2022.

“Acho que 8 anos seria absurdo, seria demais”, disse. “Se a gente entende que isso é um problema, esse problema sempre existiu, que ele seja tratado, mas sem personalizar. Sem pensar em quem vai ser impactado com ele. Por isso tem que ter um prazo maior para entrar em vigor."

Já o deputado Fabio Trad (PSD-MS), autor de uma proposta que tramita na Câmara sobre o tema, defende uma quarentena de seis anos para juízes e procuradores.

“A mencionada vedação, popularmente conhecida como quarentena, busca evitar que situações de privilégio e relacionamentos pessoais sejam utilizadas indevidamente para subverter o curso natural e justo dos processos”, disse.

Como é a regra atual

A Lei de Inelegibilidades estabelece prazo atual de até seis meses para que juízes e promotores deixem o cargo para se candidatar, dependendo do cargo. O prazo de oito anos só é aplicado se houve aposentadoria compulsória ou para os que tenham perdido o cargo por processo disciplinar.

Outros cargos também exigem saída prévia, chamada prazo de desincompatibilização, como ministros e secretários de Estado, diretores de autarquias, autoridades policiais e servidores públicos.

Repercussão

Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), defendeu o direito dos juízes de “participarem do debate público e da vida política do país, sempre respeitando os limites legais”.

Presidente da AMB comenta fala de Toffoli sobre quarentena para juiz virar candidato

Presidente da AMB comenta fala de Toffoli sobre quarentena para juiz virar candidato

“Já existem prazos estabelecidos para que juízes e promotores deixem cargos públicos para se candidatar. Portanto, a AMB é contrária a qualquer ato que vise ampliar o tempo de inelegibilidade eleitoral para membros do Poder Judiciário após afastamento definitivo da função pública. Projetos com esse teor ferem o princípio da isonomia e violam os direitos políticos dos membros do Poder Judiciário. Uma afronta desproporcional ao direito fundamental dos magistrados ao exercício da cidadania”, disse.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), juiz Eduardo André Brandão, afirmou que "hoje já existe uma quarentena de três anos para o juiz que deixa o cargo ou é exonerado para ele advogar, atuar nos tribunais de origem".

"A Ajufe entende que tem que se buscar um equilíbrio entre o que existe hoje e essa proposta feita para inelegibilidade dos magistrados”, afirmou.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, diz concordar com a proposta de Toffoli.

"A proposta que visa à ampliação do período de quarentena de membros do Ministério Público e da magistratura é muito bem vinda e muito importante. Muito bem vinda porque protege o próprio Poder Judiciário da exploração política de integrantes do Ministério Público ou da magistratura possam fazer do prestígio de seus cargos. Isso é uma salvaguarda à própria missão institucional e à separação entre poderes", afirmou em resposta à TV Globo.

Veja também

Mais lidas

Mais do G1
Deseja receber as notícias mais importantes em tempo real? Ative as notificações do G1!