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Economia Petrobras

Petrobras: ‘Se preço for represado, vai haver desabastecimento de combustível’, diz Silva e Luna

Presidente da estatal afirma que decisão de destinar R$ 300 milhões para compra de gás na baixa renda é técnica e que governo estuda criar fundo de estabilização para amortecer impacto para a população
O general Joaquim Silva e Luna foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a presidência da Petrobras Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O general Joaquim Silva e Luna foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a presidência da Petrobras Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

BRASÍLIA — A inflação e o preço dos combustíveis dominaram o debate político na última semana. O presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) , criticaram o valor de gasolina e diesel e do gás de botijão. A Petrobras, então, veio a público defender sua política de preços e aumentou o diesel após 86 dias, em uma ação que agradou ao mercado.

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À frente da companhia desde abril, quando chegou ao cargo por indicação de Bolsonaro na esteira de uma crise após reajustes, Joaquim Silva e Luna alerta que qualquer sinal de represamento de preços pode gerar desabastecimento de combustíveis no país.

No comando da estatal, ele diz que o governo busca alternativas, inclusive revendo impostos, e confirma estudos para criar um fundo de estabilização , capaz de amortecer o impacto ao consumidor, e que seria formado por tributos e dividendos pagos pela própria Petrobras.

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Como a Petrobras responde às críticas contra as altas de 36% da gasolina e de 23% do diesel nas bombas este ano?

Há um grande desconhecimento do que a Petrobras é, faz, e do que pode fazer. A percepção que se tem da Petrobras é a daquela empresa estatal na qual havia interferência do governo. A partir da Lei do Petróleo, de 2002, a Petrobras passou a sofrer concorrência. É uma empresa de economia mista, tem capital aberto. Do total de investidores que colocam recursos na Petrobras, a média é de 63% de acionistas privados. E a União tem 37%.

Ela (a União) tem capital majoritário sobre o recurso que tem voto. A Petrobras, em 2015, passou a ser a empresa mais endividada do planeta. A Operação Lava-Jato expôs uma série de problemas. Isso gerou a obrigatoriedade de a Petrobras cuidar do seu portfólio, onde vai investir. O que se pagou de dívida nos últimos cinco anos corresponde ao PIB da Hungria. A Petrobras teve que focar onde usar o seu recurso. Essa é a primeira percepção que a sociedade não tem.

“Da ordem de 30% do diesel e um pouco mais da gasolina dependem de importação. Se esse preço for praticado artificialmente, represado, vai haver desabastecimento no mercado. Isso é uma coisa grave e séria que a gente tem que estar atento ”

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Segundo, a Petrobras é a empresa mais bem controlada do planeta. Temos 21 órgãos que atuam e observam. O Cade (de defesa da concorrência), o TCU (Tribunal de Contas da União), a ANP (agência reguladora), o STF (Supremo Tribunal Federal), a Justiça dos EUA, a Bolsa do Brasil e a dos EUA. Basta uma percepção equivocada que a empresa tem que se justificar.

Alguns políticos têm dito que a Petrobras não tem responsabilidade social...

A Petrobras não pode praticar políticas públicas, mas ela tem responsabilidade social. A Petrobras faz investimentos na parte social, mas isso é pouco visível, porque estão concentrados onde ela tem refinaria. Inclusive durante a pandemia se deu muito botijão de gás. Não há um conhecimento da sociedade porque não se pode fazer isso (política pública). Alguns agentes públicos desconhecem essa informação. Qual a grande contribuição que a Petrobras pode dar para a sociedade? Pagar dividendo, pagar tributo, pagar royalties e gerar empregos. Essas são as grandes contribuições da Petrobras e não são pequenas.

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Durante o governo Bolsonaro, nós pagamos R$ 550 bilhões em tributos. Neste ano, pagamos R$ 20 bilhões em dividendos aos acionistas. Esse recurso pode ser destinado ao apoio às famílias carentes, para os caminhoneiros. Mas essa decisão não cabe à Petrobras. O Congresso está trabalhando nisso, o governo também, inclusive com a ideia de atuar sobre os tributos. Temos feito a campanha, demonstrando que, dos R$ 7 do preço da gasolina, a Petrobras participa com R$ 2, para tirar do fundo do mar, para trazer o combustível. O restante são tributos e distribuição. O ICMS incide sobre os outros tributos e sobre ele mesmo.

“Há uma ideia de criar um colchão de amortecimento. Esse valor viria dos tributos pagos pela Petrobras, que permitam formar um colchão, um fundo, capaz de fazer essa suavização (dos preços) (...) Isso é importante particularmente para os caminhoneiros ”

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A Petrobras está sendo pressionada pelo presidente a segurar preço de combustível?

Pelo presidente da República, não. Ele nunca pressionou a Petrobras. Ele busca informações, mas entende perfeitamente.

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A política de preços está mantida, mas há intervalo maior entre os reajustes. Por quê?

Até este ano, havia um repasse imediato das alterações do preço do dólar e do Brent (barril de petróleo). O que fizemos foi analisar as alterações que acontecem no mercado quase todos os dias. Deixamos de repassar imediatamente e passamos a avaliar o que são mudanças conjunturais e o que são estruturais, tanto para cima quanto para baixo.

Ficamos 86 dias sem fazer mudança no diesel, mas não é porque estávamos segurando. É porque estávamos aguardando. Uma hora subiu o Brent, mas caiu o câmbio. Essa flutuação a gente segurava. Quando estabeleceu o patamar e se manteve, a empresa fez a mudança. E assim fazemos com outros combustíveis.

A Petrobras refina todo o combustível que vende?

A quantidade de refino que a Petrobras faz e outras refinarias fazem não abastece o nosso mercado. Da ordem de 30% do diesel e um pouco mais da gasolina dependem de importação. Se esse preço for praticado artificialmente, represado, vai haver desabastecimento no mercado. Isso é uma coisa grave e séria que a gente tem que estar atento. Os valores precisam permitir que haja a importação do combustível.

Se houver um represamento do preço, pode haver desabastecimento?

Pode haver desabastecimento, não tenha dúvida.

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A Petrobras anunciou programa para subsidiar o preço do gás de botijão. A decisão foi tomada por pressão do governo?

Foi uma decisão 100% própria. Quando nós alteramos o preço dos combustíveis, a decisão é 100% técnica, não há decisões políticas nessas alterações. Ela é técnica. Essa decisão (do gás) foi da empresa, e vou mais além: ela já existia antes da minha chegada aqui, só que não havia começado. Quando houve essa incidência agora com o aumento do preço, colocamos isso em pauta.

“Essa decisão (de subsidiar gás de botijão) foi da empresa, e vou mais além: ela já existia antes da minha chegada aqui, só que não havia começado ”

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O valor colocado, de R$ 300 milhões, a ideia é procurarmos outros atores e outras empresas para aumentar esse valor. A decisão tomada foi para que esse bolo seja aumentado. Ele se destina exclusivamente ao gás de cozinha e está dentro do nosso espaço de responsabilidade social. Não tem nada a ver com política pública. Assim como a gente ajuda com a Covid, com cestas básicas, com o meio ambiente, estamos ajudando nesse sentido.

Esse programa pode ser levado para gasolina e diesel?

Não está previsto.

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O governo está trabalhando num fundo para suavizar o preço da gasolina e do diesel?

Há uma ideia de criar um colchão de amortecimento. Esse valor viria dos tributos pagos pela Petrobras, que permitam formar um colchão, um fundo, capaz de fazer essa suavização (dos preços). Quando tiver redução ou aumento do combustível, regula isso para não passar diretamente para a população. Isso é importante particularmente para os caminhoneiros, que fazem seus contratos e durante a execução daquele contrato tem alteração.

O governo está agindo, e a Petrobras faz parte dessa solução, porque ela paga dividendo, paga recursos para o Ministério da Economia tomar decisões. Junto com a Casa Civil, com o Congresso, construir uma solução para abastecer o mercado. A Petrobras não deixa faltar combustível no mercado, ela paga tributo, paga royalties e gera empregos. Essa é a grande contribuição que a empresa dá. Uma empresa robusta pode ajudar o país. Antes a empresa trabalhava seis meses por ano para pagar o juro da dívida. Passamos desse vale da morte. O governo está agindo. O presidente está preocupado e está agindo junto com os seus atores para encontrar uma solução.

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O que causou essa disparada no preço dos combustíveis?

Aconteceu uma conjunção de fatores, que o pessoal chama de tempestade perfeita. Pegou o resultado e a consequência da crise provocada pela pandemia. Tivemos o problema da crise hídrica. No Hemisfério Norte começa o inverno e a demanda maior por gás. O preço do gás está muito alto, tem desabastecimento, as commodities subiram muito. No caso da gasolina, é importante lembrar que tem 27% de etanol, com variações constantes.

O diesel tem 10% de biodiesel. É o conjunto de fatores que atuam na composição do preço. Como a Petrobras é mais visível, um alvo grande, em qualquer direção que você atirar, acerta nela, não tem jeito, mas estamos atentos a tudo. A Petrobras é totalmente sensível, é parte da sociedade.