• Daniela Frabasile
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Harry Robinson, sócio sênior da McKinsey (Foto: Anna Carolina Negri)

Harry Robinson, sócio sênior da McKinsey (Foto: Anna Carolina Negri)

Hoje, a expectativa de vida de uma empresa é de 15 anos, segundo a McKinsey. A estatística chega a preocupar até mesmo as gigantes de tecnologia. O Twitter está perto da marca – completou 13 anos em março. O Facebook já tem 15 anos, e o Google comemora 21 em setembro. Mas há outro dado que tira o sono dos líderes empresariais: a porcentagem de companhias que tentam se reinventar, mas não conseguem. Pesquisas da McKinsey mostram que 70% das transformações organizacionais falham de maneira recorrente.

Há um argumento bem convincente para investir no processo: em geral, as empresas que fazem transformações de sucesso têm EBITDA 4,5 vezes maior que a média. Mas trata-se de uma transição longa e complexa. Segundo a consultoria, a principal razão do fracasso é o comportamento das pessoas na organização - seja da gerência ou dos funcionários.

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Aos líderes que já passaram por processos de transformação, a McKinsey perguntou o que eles teriam feito diferente. As respostas mais recorrentes foram: dedicar mais tempo à comunicação dos motivos para a mudança; ter mais agilidade para neutralizar pessoas resistentes; definir metas mais claras; e dedicar mais tempo no alinhamento com a equipe de gestores.

"As empresas que conseguem completar a transformação tendem a se diferenciar completamente de suas concorrentes, o que se torna uma enorme vantagem competitiva", diz Harry Robinson, sócio sênior da McKinsey e líder global da prática de transformações. De passagem pelo Brasil, ele conversou com Época NEGÓCIOS, ao lado de Fábio Stul, sócio sênior da McKinsey e líder da prática de transformações na América Latina. Confira abaixo os principais trechos da conversa.

De acordo com os estudos da McKinsey, a expectativa de vida das empresas hoje é bem menor do que era no passado. Em 1955, era de 60 anos; hoje, é inferior a 15 anos. O que mudou?
Harry Robinson – Várias coisas são diferentes. Uma delas é a rapidez e a escala com que o capital é realocado. A segunda é a facilidade dos agentes digitais para entrar no mercado. Isso faz com que empresas com grande volume de capital sejam ameaçadas por novos modelos de negócios, que não precisam de tantos recursos. O terceiro aspecto é que as empresas estão trabalhando em parcerias para oferecer serviços e produtos aos consumidores, de uma forma que nunca haviam feito antes. Estamos em um mundo dominado por companhias que trabalham em parcerias, como parte de um ecossistema, em vez de serem apenas instituições completamente autônomas.

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O que uma empresa precisa fazer para sobreviver nesse novo cenário?
Robinson – As empresas mais bem-sucedidas tendem a pensar como atacantes: elas não se apegam às mesmas formas de fazer as coisas só por que esse é o status quo, ou por que é como faziam antes. Hoje elas assumem uma postura que as permite pensar no consumidor, se perguntar o que o consumidor quer e desenhar a evolução do negócio para se adequar às necessidades do cliente. Se isso significa acabar com uma linha de produtos, mudar a organização ou fazer aquisições que garantam capacidades que a empresa não tem, tudo bem. É preciso combinar essa postura que prioriza o consumidor com a disposição de realocar rapidamente o capital e os recursos humanos, em grande escala, e não de forma apenas incremental. Antes, quando uma empresa gastava 5% mais em um ano, ou contratava 5% mais funcionários, isso era considerado uma grande mudança. Agora, vemos mais empresas fazendo grandes apostas, como cortar 30% dos custos de uma unidade de negócios para investir mais em uma nova área. É esse tipo de atitude que ajuda as melhores empresas a crescer.

Como escolher em quais áreas apostar e de quais tirar recursos?
Robinson – É uma combinação de fatores. O que mais impulsiona o sucesso de uma empresa é estar no negócio certo, no local certo, atuando dentro de uma economia favorável, e então prosseguir de forma agressiva para absorver as oportunidades desse cenário. A chave, muitas vezes, é a granularidade. É pensar em onde estão os bolsões de crescimento, quais as oportunidades de criar valor real para o consumidor - e criar um negócio a partir disso. Não é o caso de pensar que ‘a América do Norte é uma grande economia’, mas sim que ‘o mercado de saúde no sul de Indiana vai crescer nos próximos dez anos, então como vamos nos posicionar para captar as vantagens disso?’. Acredito que é esse nível de granularidade e segmentação que faz uma empresa ter melhor desempenho do que seus concorrentes.

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Algumas das gigantes de tecnologia já têm mais de 20 anos. Como elas conseguem se manter relevantes e vivas por tanto tempo?
Robinson – Nem sempre conseguem. Se você pensar nas empresas mais importantes da tecnologia de dez anos atrás, muitas das gigantes de hoje já estavam lá, mas outras perderam a relevância. Há dez anos, o Yahoo era um dos gigantes. Então, acredito que é cada vez mais difícil se reinventar e se manter atualizado com a tecnologia de ponta. Os líderes que estão sentados em grandes pilhas de dinheiro podem fazer mais investimentos e aquisições, e assim ter acesso às tecnologias mais inovadoras. Os Facebooks do mundo se tornaram máquinas de aquisições. Eles compram tudo o que lhes interessa, mesmo que já estejam desenvolvendo uma versão própria daquele aplicativo. Esse poder financeiro é uma vantagem real das mega empresas de tecnologia.

Muitas companhias entendem que precisam mudar, mas sofrem para entender como promover essa transformação. O que um CEO precisa fazer para acelerar esse processo?
Robinson – Lidero uma  unidade na McKinsey que se chama Transformação: o propósito é ajudar as empresas a melhorar seu desempenho. Há um enorme volume de pesquisas acadêmicas sobre transformação. Um ponto em que todos os estudos concordam é que a maioria dos esforços que são anunciados fracassam. Algo como 70% dos processos de transformação falham. As razões são claras: a diretoria não está alinhada, a razão e destino da mudança não são aspiracionais o suficiente, os funcionários não têm convicção ou entusiasmo pelo objetivo que o CEO estipulou, ou não há entre os funcionários as habilidades necessárias para promover a mudança proposta.

Nas transformações bem-sucedidas, vemos que a empresa define uma meta ambiciosa. O primeiro passo para alcançar essa meta é questionar se você se livrou de todas restrições que impedem o negócio de alcançar todo o seu potencial. Como seria esse negócio, operando com sua potência máximal? Motramos aos líderes que alcançar esse potencial é um objetivo realista, que pode ser alcançado. Depois, pedimos que o cliente desenhe um plano detalhado que mostre, em cada iniciativa, o que precisa mudar. É importante ser claro quanto ao tempo e recursos necessários, e qual o resultado esperado no desempenho. O terceiro passo é cumprir o plano rigorosamente. Toda semana você deve analisar o quanto avançou, quais iniciativas estão atrasadas, o quanto estão atrasadas, e o que é preciso fazer para voltar ao cronograma.

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Quais as vantagens de seguir esse processo?
Robinson – As empresas que conseguem fazer isso tendem a se diferenciar completamente de suas concorrentes, o que se torna uma enorme vantagem competitiva. Isso dá a elas a flexibilidade para investir em crescimento, e para fazer aquisições que as demais não podem. Algumas chegam a dobrar ou triplicar sua lucratividade. É um círculo virtuoso.

Fábio Stul, sócio sênios que lidera Transformação na América Latina na McKinsey (Foto: Anna Carolina Negri)

Fábio Stul, sócio sênior que lidera a área de Transformação para a América Latina na McKinsey (Foto: Anna Carolina Negri)

Como você avalia o sucesso das empresas brasileiras que procuram a transformação digital?
Fábio Stul – Já fizemos entre 20 e 30 grandes transformações no Brasil. Uma descoberta interessante é que, na fase de identificação do potencial das empresas, é comum chegarmos a um valor 2,7 vezes maior que o estimado pela própria empresa.

Quais são as características que um CEO precisa ter para liderar esse tipo de movimento?
Robinson – Os CEOs com quem mais gosto de trabalhar são os que têm muita confiança neles mesmos. Eles acreditam que, quando estão liderando uma mudança, mesmo que esta pareça difícil, na verdade estão dando um presente para a empresa e seus funcionários. Eles têm confiança o suficiente para saber que, se liderarem, outros irão segui-los. É claro que eu gosto de trabalhar com CEOs que sejam inteligentes, engraçados ou inspiradores, mas acho que a essência do líder é a convicção e o entusiasmo para melhorar o desempenho e ajudar os funcionários a como administrar melhor a empresa.

Stul – A transformação deve ser a prioridade número um do CEO. Nos casos em que o processo foi bem-sucedido, o CEO se envolveu pessoalmente e diariamente, de forma que a mudança se confundiu com a agenda da própria empresa. Além disso, acho que o CEO tem que ter ambição. Para esses líderes, é melhor estipular uma meta de 100 e alcançar 95 do que colocar a meta em 60 e entregar 65. Também acho que é necessário ter resiliência, porque essas transformações encontram muita resistência e muitos desafios, e se manter focado é muito importante.

As expectativas para este ano são de baixo crescimento global. Quais os desafios para as empresas?
Robinson – A expectativa de baixo crescimento do PIB faz as empresas cortarem suas próprias projeções de desempenho. Elas ficam paralisadas, contratam  e investem menos. Isso é bem ruim. Veja bem, mesmo que a economia acabe se fortalecendo, essas empresas não vão conseguir sustentar seu crescimento, porque não investiram tanto quanto poderiam. Como resultado, produzem menos no ano seguinte, o que cria um freio para a economia.