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Estudo indica que remédio disponível no mercado reduz mortes de pacientes graves com Covid-19

Segundo dados preliminares, a dexametasona diminui em um terço o risco de óbito entre pessoas internadas com ventiladores mecânicos

Um medicamento barato e amplamente disponível no mundo, chamado dexametasona, pode ajudar a salvar milhares de pacientes com Covid-19 em estado grave. É o que apontam divulgações preliminares da série Recovery, o maior ensaio clínico mundial que testa tratamentos existentes no mercado para verificar se eles são eficazes no combate ao coronavírus. A pesquisa é conduzida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido.

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Especialistas afirmam que o tratamento com corticoides em dose baixa é um grande avanço na luta contra a doença. A medicação reduziu em um terço as mortes de pacientes internados com ventiladores mecânicos. Entre os doentes fazendo uso de oxigênio, a diminuição no número de mortes foi de cerca de 20%. Para pacientes com sintomas leves da Covid-19, o estudo não comprova eficácia no uso do corticoide.

"‘Dexametasona é o primeiro medicamento a demonstrar sobrevivência na Covid-19. É um resultado extremamente bem-vindo. O benefício de sobrevivência é claro em pacientes graves o suficiente para necessitar de tratamento com oxigênio. A dexametasona é barata e pode ser usada imediatamente para salvar vidas em todo o mundo", disse Peter Horby, um dos principais investigadores do estudo.

Os pesquisadores estimam que, se o medicamento estivesse disponível no Reino Unido desde o início da pandemia, até 5.000 vidas poderiam ter sido salvas. Por ser barato, o tratamento também pode ser de grande benefício em países pobres que contabilizam um número alto de pacientes com Covid-19.

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O medicamento já é usado para reduzir a inflamação em várias outras condições. Segundo o estudo, o remédio tem chances de ajudar a reduzir os danos que podem ocorrer quando o sistema imunológico do corpo entra em ação e produz uma tempestade de citocinas durante o combate ao coronavírus. O corticoide também ajuda na prevenção e combate de embolias, um dos efeitos colaterais da Covid-19.

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Para o  médico e especialista em medicina intensiva do Hospital Sírio Libanês, Luciano Cesar Azevedo, o estudo é promissor, mas é necessário aguardar a publicação completa das informações científicas.

- Nessa época de pandemia, a gente viu muita coisa que parecia promissora, e foi retirada. Ainda estamos naquela fase de ver para crer. Precisamos ter o artigo completo em mãos, para ter certeza que faz todo sentido.

A cautela é compartilhada pelo coordenador médico da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Israelita Albert Einstein, Thiago Correa. Segundo ele, a publicação em uma revista científica, o que ainda falta para o estudo de Oxford ser completamente finalizado, vai mostrar com mais clareza a metodologia aplicada e os resultados.

- Essa comunicação feita até agora é basicamente um alerta de finalização do estudo. Esse grupo de Oxford é muito sério e rigoroso. É estudo grande, conduzido por pesquisadores conhecidos e renomados. É motivo para ficar contente, vem como uma luz no fim do túnel, mas é preciso muito critério até que o resultado se torne completamente público - explica Correa.

O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Clóvis Arns da Cunha, comemorou os resultados do estudo: "impacto em reduzir a mortalidade", disse.

- Todo paciente com Covid-19 em ventilação mecânica e os que necessitam de oxigênio fora da UTI devem receber dexametasona via oral ou endovenosa. Medicação barata e de acesso universal. Dia histórico no tratamento da Covid-19 - afirmou o especialista, em nota.

Em coletiva de imprensa nesta terça-feira no Palácio dos Bandeirantes, o coordenador do Centro de Contingência da Covid-19 em São Paulo, Carlos Carvalho, também afirmou que, apesar de a pesquisa ainda não ter sido completamente avaliada, traz resultados "bastante promissores". Explicou também que a possibilidade de remédios do tipo corticosteroides fazerem parte do "arsenal terapêutico" contra o coronavírus em São Paulo já vem sendo discutida há algum tempo.

- Os corticosteroides, de uma maneira geral, já vinham fazendo parte, e estão no nosso protocolo aprovado na Secretaria de Saúde para algumas situações. A informação adicional que o estudo traz é que eles usaram em uma população mais ampla.

Testes

No teste, liderado por uma equipe da Universidade de Oxford, cerca de 2.000 pacientes hospitalizados receberam dexametasona e foram comparados com quase 4.000 que não receberam o medicamento.

Para os pacientes em ventiladores mecânicos, reduziu o risco de morte de 40% para 28%. Para pacientes que necessitam apenas de oxigênio, o risco de morte caiu de 25% para 20%.

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O pesquisador Martin Landray, que coordena a pesquisa, disse que as descobertas sugerem que para cada oito pacientes que precisam de ventiladores, pode-se salvar uma vida. Nos pacientes com oxigênio, é possível salvar uma vida a cada 20 a 25 pacientes tratados com o medicamento.

"Existe um benefício claro. O tratamento é de até 10 dias de dexametasona e custa cerca de 5 libras (cerca de R$ 35) por paciente. Portanto, basicamente custa 35 libras ( para salvar uma vida). E este é um medicamento disponível globalmente".

Os testes do Recovery estão em andamento desde março e incluíram a hidroxicloroquina, utilizada no tratamento da malária, que agora foi descartada em meio a preocupações de que aumenta o risco de morte e os problemas cardíacos.

O remdesivir, um antiviral que parece diminuir o tempo de recuperação dos pacientes com coronavírus, já está sendo disponibilizado no sistema de saúde do Reino Unido.

Conforme divulgado pelo blog da Bela Megale , o Hospital Sírio-Libanês iniciou em abril uma pesquisa com a dexametasona. A pesquisa é formada por hospitais de ponta como Sírio, Albert Einstein e Oswaldo Cruz.

Sem corrida às farmácias

Especialistas esplicam que, quando indicado, os pacientes internados devem receber o tratamento sem demora, mas as pessoas não devem sair de casa para comprar a dexametasona nas farmácias. O estudo não indica que o corticoide ajude as pessoas com sintomas mais leves da Covid-19.

Segundo o médico Luciano Azevedo, os efeitos colaterais da dexametasona incluem riscos de infecção e alterações na glicose. Por isso, o uso do medicamento só deve ser feito no hospital, apesar de não ser necessária receita médica nas farmácias.

- Ele é um antiinflamatório da classe dos corticoides, como remédios de asma. A grande preocupação é as pessoas começarem a usar indiscriminadamente. Se a pessoa é diabética, por exemplo, a glicose pode compensar. Antes que as pessoas comecem a usar para prevenir Covid-19, é importante dizer que ele só é indicado para quem está hospitalizado - explica.