Por Juliana Steil, G1 Santos


Homem usava nome de médico verdadeiro para atuar em Praia Grande (SP). — Foto: G1 Santos

O médico que teve seu nome clonado por um homem que atendia ilegalmente pessoas diagnosticadas com o novo coronavírus vive há pelo menos 16 anos em Bogotá, na Colômbia, apesar de ter registro no Conselho Regional de Medicina de São Paulo. Ele foi contatado por um colega brasileiro que encontrou seu nome em um processo seletivo para plantões em um hospital de São Caetano do Sul (SP).

Um homem, que ainda não teve o nome revelado, falsificou documentos e atuava há pelo menos um ano no Hospital Irmã Dulce, em Praia Grande. Ele foi preso no último domingo (31) durante um turno de trabalho, enquanto prestava atendimento a pessoas com Covid-19 internadas na unidade de saúde.

Em entrevista ao G1, o verdadeiro dr. Henry Cantor Bernal, de 54 anos, contou que morou por cerca de 10 anos em São Paulo, onde se especializou em oftalmologia e chegou a obter um registro no Conselho Regional de Medicina. "Consegui minha nacionalização brasileira e trabalhei como oftalmologista até 2003. No ano seguinte voltei para a Colômbia e nunca mais exerci a profissão no Brasil", conta.

Dr. Henry foi contatado por um colega brasileiro em dezembro de 2018, que contou que ele estaria participando de um processo seletivo para fazer plantões no Hospital Regional de Guarulhos, em São Paulo.

"Minha grande preocupação era que essa pessoa estava atendendo pacientes. Já pensou? Não sabemos se ele é médico. É uma falta de tudo. Ele não tem consideração pela pessoa que está atendendo ou pela responsabilidade que é a medicina. É terrível, sem respeito pela vida humana", desabafa.

Carteira de inscrição do verdadeiro médico no Conselho Regional de Medicina de SP. — Foto: G1 Santos

Investigações apontaram que o falso médico atuou, ainda, em um hospital de São Caetano do Sul (SP). Em outubro de 2019, Henry visitou o Brasil e registrou um boletim de ocorrência relatando a situação à Polícia Civil.

O médico diz que não conhece o homem que usou seu nome, mas destaca situações que observou enquanto trabalhou no Brasil. De acordo com ele, as contratações de profissionais são feitas, muitas vezes, verbalmente, sem a necessidade de verificação dos documentos.

"Sempre achei a contratação no Brasil muito informal. Muitas vezes, não assinávamos nada. Há muitas falhas na contratação. Você chegava, avisava que tinha alguma especialização e eles pegavam apenas sua carteirinha do CRM e você estava na escala", diz.

O homem foi preso e responderá por falsidade ideológica e exercício ilegal da medicina. Ele recusou-se a colaborar com as investigações e não havia informado à Polícia seu verdadeiro nome. Em contato com a Secretaria de Segurança Pública de SP, o órgão se limitou a dizer que diligências estão em andamento para verificar se o autor praticava o crime em outros hospitais da cidade ou do Estado.

Médico atuava no Hospital Irmã Dulce, em Praia Grande (SP) — Foto: Itaicy Julio/Arquivo Pessoal

A direção do Hospital Municipal Irmã Dulce esclareceu ao G1 que o homem em questão não era funcionário da unidade, e sim de uma empresa médica que presta serviços ao hospital. Tal empresa já foi acionada pelo Irmã Dulce, de acordo com a assessoria, em busca de esclarecimentos para a tomada das devidas providências.

A direção esclareceu, ainda, que foram apresentadas ao Irmã Dulce, tanto por parte da prestadora de serviços quanto de seu empregado, as devidas documentações exigidas para que o mesmo pudesse iniciar suas atividades na unidade, como registro no Conselho Regional de Medicina. Desta forma, a direção da unidade informou que registrará um boletim de ocorrência sobre o caso e segue à disposição para maiores esclarecimentos.

Em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) comunica que, em outubro de 2019, o médico Henry Cantor Bernal, entrou em contato com o Conselho informando que o registro profissional dele estava sendo usado por outra pessoa e solicitando orientações sobre como proceder. O Cremesp orientou o médico a registrar um boletim de ocorrência, documentando o fato, considerando que o exercício ilegal da medicina deve ser reportado às autoridades policiais.

O Conselho esclarece ainda que a contratação de médicos pelas unidades de saúde deve seguir critérios de checagem de documentação e consulta ao Conselho Regional de Medicina para evitar que médicos e a população sejam prejudicados. Tais critérios são amplamente divulgados aos médicos e hospitais pelo próprio órgão.

Sobre o caso em questão, o Cremesp afirma que poderá abrir sindicância para investigar a responsabilidade na contratação do falso médico.

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