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EUA anunciam retirada de 12 mil soldados da Alemanha, em represália de Trump a Merkel

Presidente americano chama governo alemão de ‘delinquente’ e diz que americanos ‘não querem mais ser otários’
Soldados americanos estacionados na Alemanha filmam um evento de artilharia em Grafenwoehr, no sul do país Foto: CHRISTOF STACHE / AFP 4-3-20
Soldados americanos estacionados na Alemanha filmam um evento de artilharia em Grafenwoehr, no sul do país Foto: CHRISTOF STACHE / AFP 4-3-20

WASHINGTON - Os EUA anunciaram que irão retirar cerca de 12 mil soldados da Alemanha, em mais um desenvolvimento da longa disputa do presidente do país, Donald Trump, com o governo de Angela Merkel. Quase metade dessas forças deve permanecer na Europa para lidar com tensões com a Rússia.

Trump anunciou no mês passad o a sua intenção de cortar em cerca de um terço o contingente de 36 mil soldados americanos na Alemanha, acusando o país aliado de não cumprir a meta de gastos de Defesa da Otan, de 2% do PIB, e de obter vantagens comerciais dos Estados Unidos. Washington mantinha cerca de 200 mil soldados na Alemanha durante a Guerra Fria, depois da qual o contingente foi reduzido

O Pentágono disse que a retirada faz parte de uma “estratégia de longo prazo”, mas Trump afirmou que a decisão é uma punição a Berlim.

— Eles estão lá para proteger a Europa. Eles estão lá para proteger a Alemanha, certo? E a Alemanha deveria pagar por isso. A Alemanha não está pagando por isso. Não queremos mais ser otários — disse Trump a jornalistas na Casa Branca. — Então, estamos reduzindo a força porque eles não estão pagando suas contas. É muito simples, eles são delinquentes.

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O secretário de Defesa americano, Mark Esper, não descreveu a retirada nesses termos e disse que a movimentação de tropas impediria o enfraquecimento da Otan e seria útil para pressionar a Rússia, após a anexação da Península da Crimeia por Moscou em 2014.

Apesar disso, Esper foi várias vezes perguntado sobre os pronunciamentos de Trump de que a retirada dos soldados era uma punição, e, pressionado, reforçou as críticas do presidente:

— Sejamos claros: acho que a Alemanha é o país mais rico da Europa, a Alemanha pode e deve pagar mais por sua defesa. Certamente deve atingir o padrão de 2% e eu argumentaria ir além disso — afirmou.

Em declarações que provavelmente irritarão Moscou, Esper disse que algumas tropas americanas seriam realocadas para a região do Mar Negro e outras poderiam se instalar temporariamente nos países bálticos.

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Pela proposta, 11.900 soldados deixarão a Alemanha. Destes, cerca 6.300 voltarão aos Estados Unidos, de onde poderão ser destacados temporariamente para outros países na Europa Oriental e ao redor do mundo, sem suas famílias. Outros 5.600 serão destacados para outros países da Otan, sobretudo Itália e Bélgica.  A sede europeia das Forças Armadas dos EUA também deve se mudar de Stuttgart, na Alemanha, para a Bélgica.

O atrito entre os EUA e a Alemanha e os demais aliados europeus americanos diz respeito a gastos com defesa nacional. Em 2014, os membros europeus da Otan concordaram em gastar 2% de seus PIBs em defesa até 2024. A Alemanha atualmente gasta 1,38%. A Bélgica investe menos de 1%, e a Itália, para onde deve ir um esquadrão de caças F-16 e dois batalhões americanos, gasta 1,2%.

As autoridades americanas enfatizaram que apenas um número relativamente pequeno de unidades destacadas seria retirada tão cedo, e que isso deve acontecer nas próximas semanas. Os demais deslocamentos de tropas devem levar anos para serem totalmente implementados, em parte devido aos possíveis bilhões de dólares em custos adicionais.

Ainda assim, as mudanças representam uma repreensão notável a um dos principais aliados militares e parceiros comerciais mais próximos dos EUA, enquanto os dois beneficiários, Itália e Bélgica, são membros da aliança que gastam pouco em defesa.

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Norbert Roettgen, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Parlamento alemão e aliado da chanceler Angela Merkel, disse que a retirada das tropas da Alemanha "enfraquecerá a Otan".

Peter Beyer, coordenador do governo alemão para as Relações Transatlânticas, disse no Twitter que “a redução das tropas dos EUA não é do interesse da segurança da Alemanha ou da Otan, e não faz sentido geopolítico para os EUA".

O senador republicano Mitt Romney, que é crítico de Trump, disse que o plano para retirar tropas da Alemanha é um "erro grave". "É um tapa na cara de um amigo e aliado", disse em comunicado.

Um assessor do candidato democrata à Presidência dos EUA, Joe Biden, disse que, se ele for eleito presidente em novembro, deverá rever a decisão de Trump de retirar as tropas da Alemanha.

Desde a Segunda Guerra Mundial, as Forças Armadas americanas consideram a Alemanha um dos locais mais estratégicos no exterior, constituindo um centro de logística para movimentos de tropas não apenas na Europa, mas também no Oriente Médio, na África e em outros lugares.

Segundo o principal comandante americano na Europa, Tod Wolters, o plano envolve mudar a sede do Comando Europeu e do Comando de Operações Especiais da Europa da Alemanha para Bélgica. Ele afirmou que, no futuro, as sedes do Comando Africano dos EUA e do Comando de Operações Especiais da África também podem passar da Alemanha para um novo local.