Rio

Passageiros relatam sumiço ou redução de horários em 30 linhas de ônibus

Redução de veículos se agravou, segundo passageiros, durante a pandemia, deixando os coletivos superlotados durante o horário de pico, contrariando as regras da Prefeitura
Fernando no ponto da Troncal 2, que pegava para a Zona Sul Foto: FABIANO ROCHA / Agência O Globo
Fernando no ponto da Troncal 2, que pegava para a Zona Sul Foto: FABIANO ROCHA / Agência O Globo

RIO - A volta de muitos cariocas ao trabalho, com a flexibilização das medidas de isolamento, está deixando evidente um problema antigo, que se agravou durante a pandemia: o sumiço das linhas de ônibus. Usuários têm que fazer longas caminhadas ou buscar outras opções como o transporte alternativo ou baldeações. Como resultado, os coletivos de trajetos em operação estão superlotados nos horários de pico, embora a prefeitura tenha determinado uma limitação de passageiros em pé nesses veículos. De acordo com reclamações dos usuários, pelo menos 20 linhas desapareceram nos últimos meses. Outras 10 que tiveram horário reduzido não normalizaram a circulação.

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O caso de desaparecimento mais recente é o da Troncal 2, que fazia o trajeto entre a Praça General Osório, em Ipanema, até a Rodoviária Novo Rio. O designer Fernando Rodriguez Ciambarella, de 39 anos, que fazia uso da linha, reclama que a maioria dos veículos não tinha ar-condicionado, demorava a passar no ponto, mas mesmo assim está fazendo muita falta por ser a principal ligação com a Zona Sul, de passageiros que, como ele, moram na Lapa. Também era uma das melhores opções para quem se dirigia à rodoviária.

— Ruim com ela, pior sem ela. Vai fazer falta. Era o único ônibus que eu pegava na Rua Augusto Severo (na Glória) e ia até o fim do Leblon. Era também uma boa opção na volta para casa. Agora, a melhor alternativa para fazer o mesmo trajeto é o metrô. Mas, terei de fazer uma caminhada maior até a estação da Glória — reclamou o passageiro.

Desde o sumiço da 653 (Marechal Hermes - Méier), a operadora de caixa, Mônica Andrade, de 39 anos, moradora em Madureira, tem recorrido ao apoio do pai para conseguir chegar ao trabalho, no Méier. Na volta ajuda paterna também é fundamental, por conta da escassez de ônibus.

— Sem o 653 teria de pegar dois ônibus. Como iria demorar muito, meu pai me leva. Na volta para casa eu pego o 353 (Rodoviária-Praça Seca, via Méier) até a metade do caminho, onde meu pai me busca - contou Mônica.

O problema afeta passageiros de diferentes regiões da cidade, mas a situação é mais grave na Zona Oeste, atendida pela maioria das linhas que sumiram. O mecânico de elevadores João Pedro Souza da Silva, de 22 anos, que tem clientes em diferentes bairros da cidade, está sendo obrigado a sair de casa mais cedo para conseguir cumprir os compromissos no horário marcado. O morador de Realengo costumava utilizar com mais frequência as linhas 741 e 743, que faziam o trajeto Bangu-Barata, além da 744 (Realengo-Cascadura), que segundo ele desapareceram das ruas ainda no começo da pandemia.

— Quando preciso atender um cliente em Bangu, tenho de andar mais de meia hora até o centro de Realengo e embarcar em outro ônibus que leve ao meu destino. Muita gente no bairro faz isso e acaba pegando um veículo que já vem cheio, porque está transportando pessoas que não usavam a linha. Quando tendo de ir para Cascadura, é o mesmo problema. São 20 minutos de caminhada até o ponto do 383 (Realengo-Praça da República), que por ser a única opção para o Centro só anda lotado — queixa-se o passageiro.

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O morador de Barra de Guaratiba Luiz Guilherme Siqueira de Albuquerque, de 19 anos, reclama do sumiço da 891, que servia de ligação entre o bairro de Sepetiba e a estação de Mato Alto do BRT. Essa mesma linha era utilizada pelo promotor de vendas Luis dos Santos, de 31 anos, morador de Sepetiba, que alega estar fazendo no dobro do tempo o trajeto até o BRT, antes completado em 20 minutos. Já o autônomo Eduardo Correia, de 52, fazia uso da 870 (Sepetiba-Santa Cruz), tanto para ir ao trabalho como para comparecer às consultas médicas. Ele diz que restou como opção apenas uma linha intermunicipal que só circula com carros velhos. Além disso, como há poucos veículos, demoram até uma hora para passar no ponto.

— É bem complicado. Com a volta ao trabalho, as pessoas ficaram sem opção e têm de contar com as vans que, em sua maioria, não aceitam o Bilhete Único e só andam lotadas. Estamos abandonados aqui na Zona Oeste — lamentou Eduardo.

Além das linhas que despareceram por completo das ruas, os passageiros se queixam também das que estão circulando com horário reduzido, também desde o início da pandemia, quando o isolamento social provocou uma queda no volume de passageiros. Porém, em meados de junho, a prefeitura determinou que tanto as linhas convencionais como os BRT voltassem a rodar com a totalidade de suas frotas, para atender a demanda dos usuários, com a retomada gradual das atividades na cidade, iniciada no começo daquele mês.

— A linha 790 (Campo Grande-Cascadura) para de circular às 21h para a Vila Kennedy e 21h30 pela a Vila Aliança. Antes, circulava até 0h15m. Liguei para a SMTR pedindo esclarecimentos e solicitando retorno do horário habitual da linha, mas não obtive resposta. A prefeitura autorizou os serviços a funcionarem, mas o de transporte está só piorando. A volta para casa é pior, pois a frota está reduzida e quem precisa trabalhar após 22h fica no ponto ou precisa pagar outra passagem para chegar em casa. Um absurdo e uma falta de respeito. A cada dia que passa, só piora o transporte no Rio de Janeiro. Se antes, estava ruim, agora piorou de vez — diz Leandro Silva, de 35 anos, morador de Campo Grande.

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Sem transporte

As linhas que, segundo os passageiros, desapareceram durante a pandemia são as seguintes: Troncal 2 (General Osório - Rodoviária), 134 (Santa Alexandrina - Circular), 277 (Rocha Miranda Candelária), 653 (Marechal Hermes-Méier), 676 (Méier-Penha), 741 (Bangu-Barata), 743 (Bangu-Barata), 744 (Realengo-Cascadura), 773 (Cascadura-Pavuna), 782 (Cascadura-Marechal), 786 (Marechal Hermes - Campo Grande), 789 (Cascadura- Campo Grande), 822 (Corcundinha-Campo Grande), 825 (Jesuítas - Campo Grande), 830 (Serrinha - Campo Grande), 850 (Mendanha-Campo Grande), 870 e SV870 (Sepetiba-Santa Cruz), 891 (Sepetiba - Mato Alto), 893 (Jardim Palmares-Campo Grande) e 895 (Serrinha-Campo Grande).

Já as que circulam em horário reduzido, também de acordo com os usuários, são: 679 (Grotão - Méier), 685 (Coelho Neto-Méier), 731 (Marechal hermes- Campo Grande), 737 (Santíssimo-Marechal Hermes), 786 (Campo Grande-Marechal), 789 (Campo Grande-Cascadura), 790 (Campo Grande-Cascadura), 853 (Vila Kennedy-Mato Ato), 2383 (Sepetiba-Carioca, via Av Brasil) e 2337 (Sepetiba-Castelo, via Zona Sul).

O que dizem os consórcios

Os consórcios Internorte e Transcarioca justificaram, por meio de nota, que as restrições impostas pela pandemia do novo coronavírus nos deslocamentos da população agravaram drasticamente a crise econômica que atinge o setor de transporte público nos últimos anos, reduzindo a capacidade financeira das empresas e impossibilitando a retomada plena das atividades, com reflexos diretos no serviço prestado aos passageiros na cidade.

“A diminuição de 50% no número de passageiros transportados, mesmo com a flexibilização do isolamento social, aliada à falta de medidas efetivas da administração pública para apoiar financeiramente o setor de ônibus, não tem permitido a recuperação econômica das empresas e a normalização de todas as operações, impactando a circulação de algumas linhas. Em regiões da cidade com a presença do transporte alternativo clandestino, a concorrência de aplicativos em trajetos curtos e a falta de segurança pública, a situação é anda mais grave para as empresas de ônibus.

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É importante ressaltar que os consórcios estão promovendo todos os esforços para manter o atendimento à população, mas é imprescindível que sejam adotadas, de modo urgente e emergencial, medidas que possam reduzir o grave desequilíbrio econômico-financeiro que atinge há anos o setor de transporte público por ônibus, que foi agravado pela pandemia. Não é mais razoável que o sistema de transporte dependa exclusivamente da tarifa como forma de financiamento, em um momento em que o passageiro convive com a diminuição de renda, suspensão de contrato de trabalho e desemprego.”

Procurada, a Secretaria Municipal de Transportes informa que, em monitoramento realizado nesta segunda-feira (13), foi constatada a inoperância das linhas 134, 277, 653, 731, 737, 741, 743, 744, 782, 786, 789,790, 822, 825, 830, 850, 870 e SV870, 891, 893, 895, 2383 e 893, e a circulação de frota abaixo do determinado das linhas 102, 473, 679, 685, 853 e 2337. Já a linha 676 foi extinta.

Em relação a linha 2337, informou que em monitoramento realizado nesta tarde, foi constatado que a linha está circulando com frota abaixo do determinado e o consórcio responsável pela linha foi autuado pela irregularidade.

A pasta garantiu que os consórcios responsáveis pelas linhas com inconformidade nos serviços foram autuados. Somente neste ano, segundo a prefeitura, 971 multas foram aplicadas aos consórcios atuantes no município, por inoperância ou circulação de frota abaixo do determinado.

O Consórcio Santa Cruz, que atende a Zona Oeste, ainda não respondeu.