Quilombolas denunciam ataques em Lauro: 'destruíram o que viram pela frente'

Alvos de especulação após Via Metropolitana, moradores de Quingoma já registraram mais de 10 boletins de ocorrência

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  • Bruno Wendel

Publicado em 17 de julho de 2019 às 18:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Acervo pessoal

O ataque sofrido pelo Quilombo Quingoma, em Lauro de Freitas, Região Metropolitana de Salvador (RMS), no último domingo (14), está longe de ser um caso isolado. Desde a implantação da Via Metropolitana Camaçari – Lauro de Freitas, em junho do ano passado, já foram registradas mais de 10 ocorrências de violência contra o povo do quilombo na 27ª Delegacia (Itinga). “Já puseram fogo nos barracos, destruíram alvenarias, ameaçaram e espancaram quilombolas. Isso sempre existiu, mas depois da Via Metropolitana as coisas se intensificaram. Isso é fruto da especulação imobiliária", declarou Ana Lúcia Santos Silva, conhecida como Donana, 57, coordenadora da Associação Quilombola de Quingoma.Ela acredita que o objetivo dos agressores é expulsar os quilombolas da região, para que possam construir prédios. "Querem nos expulsar daqui para tomar a nossa terra, querem construir prédios e outras edificações no entorno da nova via. Chegam se apresentando como policiais, batendo, chamando a gente de invasores e bandidos. Dizem que a gente tem que sair porque a terra é deles”, comentou.

No domingo, o Quilombo Quingoma foi invadido por volta das 8h30, por um grupo de homens que chegaram em quatro carros. “Estávamos reunidos em assembleia quando outros moradores chegaram dizendo que estavam tocando fogo nas casas. Eles (criminosos) chegaram armados e destruíram o que viram pela frente”, contou Ana Lúcia ao CORREIO.

Por meio de nota, a assessoria de comunicação da Polícia Civil se manifestou e disse que “equipes da 27ª Delegacia Territorial de Itinga e do Grupo Especial de Mediação e Acompanhamento de Conflitos Agrários e Urbanos (Gemacau) iniciaram as investigações, para identificar e prender os autores do ataque a uma comunidade Quilombola, na localidade de Quingoma, em Lauro de Freitas, que deixou algumas casas destruídas, no domingo (14)".

Ainda segundo a polícia, uma perícia foi realizada no local e moradores serão ouvidos na unidade policial. Não há informações de quantas pessoas já prestaram depoimento até o momento, nem de quando as restantes serão ouvidas. Já sobre as mais de 10 ocorrências relacionadas à violência contra o povo do quilombo, a Polícia Civil não se manifestou.

O CORREIO também procurou a Secretaria de Promoção à Igualdade Racial (Sepromi) para comentar os recorrentes casos na região. A assessoria de comunicação informou apenas que o órgão acompanha o desdobramento das investigações da Polícia Civil e se coloca à disposição para possíveis demandas da comunidade, sem informar que tipo de apoio é prestado às vítimas. Foto: Acervo pessoal Terreno A área quilombola tem 1.284 hectares e foi certificada pela Fundação Cultural Palmares no dia 13 de julho 2013. “O documento diz que nós estamos numa área quilombola. Só que precisamos da titulação”, explicou Ana Lúcia.

Para a emissão do título é necessário um Relatório Territorial de Identificação e Demarcação (RTID), que é emitido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). “O problema é que o Incra alega que não tem recursos e nem material humano para dar celeridade a esse processo. Agora, quem vai fazer é a CDA (Coordenação de Desenvolvimento Agrário)”, disse Ana Lúcia. 

O CORREIO procurou a CDA, unidade da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR). A coordenadora administrativa e financeira, Andréa Almeida, informou que na semana passada foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF) um procedimento final de abertura de uma licitação para contratação de uma empresa para desempenhar a atividade de regularização do quilombo.

De acordo com a coordenadora executiva da CDA, Renata Rossi, o resultado da licitação para contratação de empresa para a prestação de serviços de elaboração de peças técnicas necessárias a conclusão do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade remanescente do Quilombo Quingom foi homologado no dia 9 de julho.

A vencedora foi a Empresa de Meio Ambiente do Brasil (Emab). Uma vistoria foi realizada na sede da empresa nesta quarta-feira e a previsão é que até sexta-feira (19) seja assinado o contrato, que deve ter duração de quatro meses.

O CORREIO também procurou a assessoria de comunicação do MPF para ter mais detalhes sobre a licitação, mas não obteve resposta. A Prefeitura de Lauro de Freitas também foi procurada, mas ainda não se manifestou.