Por Milena Castro *


Equipe do EMA, da UnB, que desenvolve tecnologias para pessoas com lesão medular — Foto: EMA/ Divulgação

Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) criaram uma tecnologia que ajuda pessoas paraplégicas a pedalar, com as próprias pernas. O movimento ocorre por meio de eletroestimulação (saiba mais abaixo).

"O aparelho age como um atalho estimulando os músculos por meio de choques programados", explica Roberto Baptista, coordenador do projeto EMA – Empoderando Mobilidade e Autonomia – que desenvolve soluções para auxiliar na reabilitação de pessoas com lesão medular. A iniciativa reúne estudantes e professores dos cursos de fisioterapia, educação física e engenharias.

"A grande inovação deste aparelho é que a gente conseguiu contração muscular de uma forma sequenciada e ritmada, capaz de gerar movimento", diz Baptista.

Benefícios da tecnologia

Alunos da UnB apresentam triciclo para paraplégicos

Alunos da UnB apresentam triciclo para paraplégicos

Segundo os pesquisadores do EMA, o objetivo é fazer com que toda tecnologia desenvolvida saia do laboratório e chegue até as pessoas, proporcionando qualidade de vida. O grupo esclarece que o aparelho que permite pedalar pode ser usado na prática esportiva e na fisioterapia.

"Os principais benefícios são o ganho de massa muscular, a melhoria da circulação sanguínea e da densidade óssea", dizem os pesquisadores.

Roberto Baptista aponta que essa tecnologia ajuda a exercitar os músculos paralisados através de estímulos específicos. O coordenador do EMA conta que, diferentemente do tratamento convencional com choque, o aparelho foca no movimento.

"O que empurra a bicicleta é força dos músculos da pessoa", explica.

Voluntário

Atleta Estevão Lopes sofreu uma lesão medular provocada por uma bala perdida usa tecnologia que ajuda pessoas paraplégicas a pedalar — Foto: TV Globo/Reprodução

Em 2014, após desenvolverem toda a parte de algoritmos e montarem o equipamento, os pesquisadores começaram os testes, em uma espécie de triciclo. A ideia era ver se as pessoas paraplégicas conseguiam pedalar com as próprias pernas.

Um dos participantes desta fase foi o atleta Estevão Lopes, que sofreu uma lesão medular provocada por uma bala perdida. Estevão conta que uma das fisioterapeutas do EMA o procurou, e falou sobre eletroestimulação.

"Ela disse que através da eletroestimulação eu poderia pedalar. Aí eu pensei comigo: eu sou cadeirante não mexo um dedo, que história mais doida dessa menina. Voltar a pedalar?", lembra Estevão.

Depois de muita insistência, o atleta aceitou ir até o laboratório da UnB. "Fui sem expectativa nenhuma. Mas aí, ela conectou os elétrodos na minha perna e, pra minha surpresa, a musculatura começou a responder", conta o atleta.

"Ela colocou uma caneleira de cinco quilos e fez o movimento de extensão. Minha perna subiu. Quando eu vi aquilo, eu percebi que fazia sentido o que ela estava falando", diz.

Destino: Zurique

Equipe do EMA, da UnB, em Zurique, em 2016 — Foto: EMA/ Divulgação

Os resultados dos testes foram tão promissores que a equipe do EMA, tendo Estevão como atleta, foi reconhecido em Zurique, na Suíça. O grupo participou da primeira edição da competição mundial Cybathlon – um campeonato em que pessoas com deficiência física competem utilizando sistemas de tecnologias de última geração.

A competição, que aconteceu em 2016, foi o passo seguinte para mostrar ao mundo o que estava sendo desenvolvido nos laboratórios de Brasília. Roberto Baptista explica que um dos objetivos do Cybathlon é colocar a tecnologia em um contexto de competição, que vai elevar ao limite a usabilidade e, com isso, encurtar o espaço entre ter uma tecnologia de ponta, no laboratório, até que ela chegue ao usuário final.

Para Estevão, esse objetivo é real. "Existe um aparelho eletroestimulador acoplado no triciclo e os engenheiros desenvolveram uma interface que faz o papel do cérebro. Então, essa interface, manda o comando pro aparelho, o aparelho manda o choque pro músculo e eu consigo pedalar", comemora.

Apesar de não conseguir o primeiro lugar na edição de 2016, os pesquisadores avaliam que foi uma participação importante. "O grupo foi capaz de demonstrar o funcionamento de sistemas que não apenas permitem a prática do ciclismo, mas também do remo ergômetro e da marcha assistida por órteses ativas", apontam.

4 anos depois

Tecnologia desenvolvida por pesquisadores da UnB ajuda paraplégicos a pedalar — Foto: TV Globo/Reprodução

Quatro anos depois da primeira participação no Cybathlon, o grupo da UnB competiu novamente. Desta vez, porém, de forma remota, por causa da pandemia do novo coronavírus.

O campeonato foi realizado, na sexta-feira (13) e no sábado (14), por meio de uma plataforma online. O pesquisador Roberto Baptista conta que o maior desafio foi a diminuição na equipe, que passou de 20 pesquisadores, com dedicação exclusiva e auxílio-financeiro, para sete, que atuam de forma voluntária.

"Nossa participação, além da questão competitiva, tem como principal objetivo marcar território. É participar e mostrar que a gente tá vivo, digamos assim", conta Baptista.

Ao todo, 70 equipes de 23 países competiram, em pelo menos, uma das seis categorias. A EMA foi a única representante do Brasil e ficou em sexto lugar na categoria "Corrida de Bicicleta por Estimulação Elétrica Funcional".

*Sob supervisão de Maria Helena Martinho

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