Empresas

Por Naiara Bertão, Valor Investe — São Paulo


Quando se fala em conselho de administração (CA), a primeira imagem que vêm à cabeça é de um grupo de pessoas com cabelos brancos, décadas de experiências profissionais, boa parte homens brancos, tomando cafezinho e deliberando sobre contas da companhia, uma eventual fusão ou aquisição ou trazendo algum pitaco na estratégia da empresa. É essa, de fato, a realidade de grande parte dos colegiados hoje no Brasil. Mas as coisas estão mudando, a começar pela chegada, em algumas organizações, de pessoas com menos de 40 anos, algo impensável quando se fala de um órgão que exige experiência.

Ainda são poucos os conselheiros mais jovens em empresas de capital aberto. É mais comum encontrar algum herdeiro que representa a família controladora e começa a se preparar para a sucessão. Mas a entrada de jovens como o empresário Tallis Gomes, de 34 anos, no conselho da Espaçolaser e da Hope, a escolha de Pedro Franceschi, de 24 anos, para o colegiado da empresa de meios de pagamento Stone, a indicação da contadora e analista de ações Louise Barsi, de 26 anos, para o conselho de administração da Eternit e o fiscal da AES Brasil, Klabin e Santander, além de Bruno Nardon, 34 anos, para o CA do Grupo Martins e de outras duas companhias de capital fechado, mostram que algo está mudando. Lentamente, sim, mas em movimento.

“Darwin nunca fez tanto sentido. As empresas que vencem hoje não são as mais antigas, poderosas e mais ricas. Mas sim as que têm capacidade de aprendizado, de adaptação. Vence quem se adapta mais rápido a nova realidade. Hoje o Nubank, que foi fundado em 2013, já vale mais do que o Banco do Brasil, fundado em 1808, porque se adaptou melhor às novas ferramentas do mercado”, diz Tallis Gomes, fundador da empresa de tecnologia para transporte Easy Táxi e agora à frente da Singu, plataforma que intermedia serviços de beleza.

Sua chegada ao conselho da Espaçolaser, que abriu seu capital na B3 em janeiro de 2021, e ao colegiado do Grupo Hope, de vestuário íntimo, se deu após uma passagem pelo conselho da transportadora mineira de cargas Transpass. “

“Ano passado fui convidado pelo presidente do conselho para me sentar em uma cadeira de inovação. Os trabalhos foram acontecendo ali, o pessoal gostou das minhas contribuições e acabou chegando meu nome aos ouvidos de outras companhias, dentre elas Espaçolaser, que precisa repensar o mercado de serviços de beleza”, conta.

Apesar da pouca idade, Tallis é velho conhecido do mundo dos negócios. Começou a trabalhar aos 14 anos, comprando e revendendo celulares. Em 2011, fundou a Easy Taxi, um aplicativo que intermediava corridas de táxi, desbravando um mercado que depois se tornaria bem popular no Brasil. Em 2015, já afastado de sua empresa anterior, fundou outra startup, a Singu, que também visa conectar consumidores a profissionais que prestam serviço, mas dessa vez do mundo da beleza. No fim do ano passado, a Singu firmou acordo com a Natura, que dá à companhia a opção de assumir 100% da startup no futuro.

“Eu sou novo, mas tenho 20 anos de experiência. Meu objetivo é mostrar às companhias como utilizar suas forças e as ferramentais disponíveis e apontar no caminho da inovação”, afirma. Ele conta que uma primeira recomendação que leva a qualquer reunião que é chamado é de não ter um departamento único de inovação e sim formar times multidisciplinares que inovem em todas as áreas. Outra contribuição é na estratégia de vendas no digital, algo que as empresas aprenderam pelo amor ou pela dor, durante a pandemia, que precisavam focar.

“Tenho um estilo diferente de conselheiro, eu sempre assumo comitês, geralmente o de Inovação ou de Gente. Eu tenho um olhar que vai permitir que o comitê construa ferramentas para aumentar a eficiência. Eu sou um pouco mais mão na massa do que o habitual e prefiro me envolver um pouco mais do que é esperado de um conselheiro”, comenta Tallis.

Tallis Gomes, fundador da Easy Táxi e Singu e jovem conselheiro — Foto: Divulgação
Tallis Gomes, fundador da Easy Táxi e Singu e jovem conselheiro — Foto: Divulgação

A trajetória de Louise Barsi, provavelmente a mais nova conselheira hoje de empresas de capital aberto (não há dados disponíveis para comprovar), já foi diferente.

Sua participação em colegiados começou em 2016, aos 21 anos, quando foi indicada por seu pai, Luiz Barsi Filho, maior investidor individual na bolsa brasileira, para ocupar um assento no conselho fiscal da indústria química Unipar Carbocloro (onde hoje é suplente). Um ano depois, foi a vez de entrar no conselho de administração da empresa de produtos para construção civil Eternit, onde continua até hoje. Sempre atuando como representante dos independentes.

“Quanto maior diversidade de opiniões para serem ouvidas, mais valor é gerado dentro de um conselho. O conselheiro tem que monitorar, deliberar e aconselhar de acordo com diretrizes estratégicas, de forma mais independente possível”, comenta Louise, que cursa o pós-MBA na Saint Paul Escola de Negócios no Advanced Boardroom Program for Women.

Ela comenta ao Valor Investe que teve sorte de ter a oportunidade de entrar em um conselho desde cedo, algo raro. “O primeiro conselho que fui eleita e que meu pai não me elegeu sozinho, que tive apoio de outros investidores, foi o fiscal da Klablin. Vi isso como uma forma de reconhecimento pelo meu trabalho”, comenta.

Louise acredita que o conhecimento em contabilidade (sua formação acadêmica) e o período em que trabalhou como analista de ações ajudaram a se consolidar na carreira, ainda que não tenha tido experiência prévia em gestão de negócios, como é comum.

“Como analista, eu analisava empresas e recomendava para os investidores; no 'board', eu faço algo semelhante, mas recomendo para os executivos. Os membros do conselho sintetizam informações e aconselham algo eloquente com a estratégia de criação de valor de longo prazo da companhia. Com o tempo, fui me aperfeiçoando”, conta.

Os anos na Eternit, período em que a empresa passava por uma reestruturação grande e turbulento processo de recuperação judicial, com certeza ajudaram a calejar seu trabalho. Além dos desafios operacionais e técnicos – a empresa precisou deixar de lado sua principal matéria-prima, o amianto – o próprio conselho estava dividido. “Foi uma tempestade perfeita”, disse. “Hoje eu vejo que essa experiência me fez melhor preparada para enfrentar outros desafios”, completa.

Louise Barsi, do Ações Garantem o Futuro e mais jovem conselheira — Foto: Divulgação
Louise Barsi, do Ações Garantem o Futuro e mais jovem conselheira — Foto: Divulgação

Ao invés da escada, elevador

O caminho mais comum até a chegada ao conselho de administração (CA) é uma escada. Exige muitos quilômetros rodados de aprendizado em uma ou mais organização, saindo dos níveis mais baixos, passando pela gerência, chegando na diretoria, até, eventualmente, ocupar o cargo de líder máximo da empresa. Essa é a típica trajetória que conselheiros hoje atuantes passaram. Como esse percurso pode demorar mais de 10 anos, não é de se estranhar que a média de idade dos conselheiros ativos seja alta.

Dados da consultoria Spencer Stuart, em seu “Board Index Brasil” de 2020, mostram que, em média, a idade dos membros do conselho de administração é de 57 anos. Em 2019 era um pouco maior, de 57,2 anos, mas em anos anteriores chegou a ser menor, como 54,5 anos em 2017. O Brasil está alinhado com o que se pratica em outros países, uma vez que a média internacional, também medida pela consultoria, é de 58 anos. Alguns lugares, como o Canadá, a média chega a ser mais alta, de 62,7 anos, enquanto em outros, como a Rússia, tinha em 2020 uma média de idade de 54,3 anos dos conselheiros.

Como toda média estatística que se preze, há pessoas nos dois extremos – gente de 20 e poucos anos e outros de mais de 90. Alguns sobem de escada mesmo, enquanto outros estão pegando o elevador. Mas a verdade é que os conselhos – ainda - são seniores: 78% dos membros têm entre 40 e 69 anos. “Ainda” porque, se depender da oferta, esse quadro deve mudar nos próximos anos, uma vez que os mais jovens se interessam cada vez mais pela profissão.

A pedido do Valor Investe, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), fez um levantamento com sua base de certificados ativos, que somam 1.172 pessoas, e identificou que pessoas com menos de 40 anos são ainda minoria - a média de idade é de 57 anos. Do total de 2.181 inscritos para seu curso de formação de conselheiros em 2020, 21% tinha até 40 anos. Se considerar o recorte de alunos com até 50 anos, o percentual em 2020 sobe para 48% do total. A média geral de todos os cursos foi de 48 anos.

O mais importante é a diversidade. Nem só jovem, nem só velho. O problema é que não dá para colocar todos os representantes de todos os acionistas no conselho, não cabe. Por isso, é importante trazer diversidade para a diretoria executiva também. A diversidade precisa estar em toda a empresa, entre os novos entrantes, na média gerência, nas diretorias, presidência e conselho”, comenta Valéria Café, diretora de Vocalização e Influência do IBGC.

Ela pontua que o conselho é o órgão que representa os acionistas e visa garantir e acompanhar que as ações tomadas pelo executivo da empresa sejam as melhores. “Quem vai tomar a ação é o executivo da empresa. O conselho como o próprio nome diz, acompanha, monitora, aconselha e tem, inclusive, dever fiduciário”, completa a executiva.

Valéria acredita que ter uma certa bagagem ajuda bastante a cumprir o que se espera de um conselheiro, até para ter autoconfiança e firmeza em aconselhar a diretoria sobre determinada tomada de decisão. Mas pontua que acima de tudo é necessário trazer pessoas diversas que agreguem para os objetivos da empresa para aquele período.

“Precisa ter diversidade de opiniões, geografias, países, gênero, raça, etnia, idade, de acordo com o que a empresa quer. Se é uma empresa que quer expandir para outras regiões do país, tem que ter gente que conheça bem as características locais. Se quer se internacionalizar, deve chamar conselheiros com experiência em internacionalização. Se é uma companhia de varejo de moda, tem que ter mulheres que enxerguem o mercado feminino. Se a necessidade é ser mais inovadora, precisa eleger gente que tenha o olhar digital”, exemplifica.

Não é para todos

Geralmente as empresas têm de nove a 13 cadeiras no CA entre membros eletivos e suplentes. Segundo a Spencer Stuart, no ano passado os colegiados se reuniram, em média, 18 vezes. Os membros também participam em comitês específicos, como RH/pessoas, remuneração, auditoria, riscos, finanças, estratégia e expansão, inovação e transformação digital, entre outros. Não é, portanto, um trabalho que dê para tocar facilmente em paralelo a muitas outras coisas.

Para Herbert Steinberg, especialista em governança corporativa e fundador da consultoria MESA Corporate Governance, o conselho de administração precisa ter uma composição de pessoas com experiências e habilidades que, no conjunto, ajude a empresa a lidar com aquela fase em especial. Se o momento for de dificuldade financeira, precisa ter gente para trazer ideias para reverter a situação. Se é hora de migrar para um negócio digital, precisa haver entre os membros quem entenda do assunto ou, ao menos, tenha bons contatos na área.

“Um bom conselho é que serve diversidade, várias visões para melhor tomada de decisão. Estamos em um momento de transformação brutal, que foi acelerado com o evento da pandemia, e acelerou a visão das pessoas sobre a necessidade de transformação”, diz Steinberg.

Ele concorda que ter pessoas com a cabeça mais voltada aos novos tempos pode ajudar, mas tem dúvidas se é no conselho de administração o seu lugar. Ele critica, por exemplo, empresas que trazem pessoas de fora, terceiros, para dar opiniões e ajudar na inovação e acham que isso é suficiente para mudar a cultura da empresa. Isso porque não é uma tarefa simples, mas sim desafiadora. Em sua opinião, apesar de muita gente saber como começar o processo de inovação, não sabe onde chegar. No CA, diz, o trabalho é mais sério.

“Conselheiro não é o cara encostado. Precisa ser alguém ativo, empreendedor, que foi diretor financeiro ou CEO, que entende de negócios e conhece mais de uma indústria, não ter cabelos para não tremer”, comenta, ao defender, brincando, que a falta de cabelo é sinal de ‘casca’, resiliência. “Na hora de fazer uma ponte de safena e abrir o coração, você certamente vai querer alguém que entenda do que está fazendo. Assim como um piloto experiente que sabe pousar o helicóptero em dia de chuva’, continua.

Steinberg conta que de todas as empresas que chegam até a sua consultoria para pedir indicações de conselheiros, quase todas pedem pessoas mais maduras e que entendam muito de algo que a empresa precisa naquele momento, especialistas. Além do despreparo de muitas pessoas que anseiam uma vaga em conselho, outra crítica que ele tem é que jovens são muito ansiosos para “apertar os botões” e o papel do conselho é mais ouvir, pesquisar, sugerir e não agir.

Gustavo Succi, fundador do Conselho Mudando o Jogo (CMJ), empresa que tem o objetivo de democratizar o acesso a conselhos de administração para empresas menores, diverge um pouco da opinião de Steinberg. Ele concorda que inserir pessoas com menos de 40 anos em CAs não é uma tendência, já que ainda são poucos os exemplos e as empresas continuam procurando profissionais mais experientes e mais velhos, mas ele acredita que as empresas só têm a ganhar se aproximando de jovens.

“Com a profissionalização dos conselhos que vem ocorrendo em 2021, começamos a ver uma mudança na composição. Antes, era comum um grupo de amigos dos empresários e diretores serem eleitos e ocuparem por anos as cadeiras. Já vemos uma mudança nisso”, disse. A renovação, em sua opinião é importante, assim como a diversidade, inclusive de idades.

Em sua empresa, o CMJ, que oferece a pequenas e médias empresas conselhos consultivos compartilhados, ele conta que sempre convida um conselheiro mais jovem para compor a bancada. “Os jovens trazem visões, premissas e dinâmicas que quem era mais velho não viveu. Têm o que aprender ainda, mas também o que ensinar”, pontua Succi.

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