Brasil Sustentabilidade

Temperatura do planeta poderá aumentar 3,2 graus Celsius, muito além da meta de 1,5

Nenhum dos países mais ricos do mundo está agindo em linha com Acordo do Clima de Paris

Queimada na região de Alta Floresta, Mato Grosso, em 2007: depois de anos de recuo, desmatamento voltou a aumentar no Brasil, tirando o país da rota de cumprir meta do Acordo de Paris para limitar aquecimento global a 1,5º Celsius
Foto:
Daniel Beltra/17-09-2007
Queimada na região de Alta Floresta, Mato Grosso, em 2007: depois de anos de recuo, desmatamento voltou a aumentar no Brasil, tirando o país da rota de cumprir meta do Acordo de Paris para limitar aquecimento global a 1,5º Celsius Foto: Daniel Beltra/17-09-2007

RIO - As nações mais ricas do mundo estão longe de tomar as medidas necessárias para conter o aquecimento global e limitar as mudanças climáticas dele consequentes, aponta relatório divulgado nesta quarta-feira pela Climate Transparency, parceria internacional entre organizações e institutos dedicados à avaliação e pesquisa do tema. Segundo o levantamento, 82% da energia utilizada pelos países do G-20, grupo que reúne as 20 maiores economias do planeta, ainda vem de combustíveis fósseis, uma das principais fontes de gases do efeito estufa emitidos pela ação humana, com Austrália, Arábia Saudita e Japão dependendo deles para mais de 90% de seu suprimento de energia.

Assim, se tudo continuar como está, no fim do século a temperatura média da Terra estará ao menos 3,2º Celsius acima da registrada no início da Revolução Industrial no século XIX, muito além da meta de 1,5º Celsius definida no Acordo do Clima de Paris, aponta o documento, intitulado “Brown to green” (“De marrom a verde”, em tradução livre). Ainda de acordo com relatório, nenhum dos países do G-20 assumiu até agora compromissos de cortes nas emissões compatíveis com este objetivo, e só a Índia está chegando perto, num caminho alinhado a um aquecimento de 2º Celsius, teto do acerto assinado na Conferência do Clima realizada na França em 2015. As nações do G-20 têm um papel fundamental no cumprimento deste compromisso, já que respondem por cerca de 80% das emissões globais de gases do efeito estufa.

- O recente relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU) sobre o objetivo de 1,5º Celsius nos mostrou que o mundo precisa intensificar as ações contra as mudanças climáticas – lembra Jiang Kejun, cientista do Instituto de Pesquisas de Energia da China e um dos coautores do relatório. - A geração de energia com carvão, óleo e gás e os transportes produzem a maior parte das emissões na vasta maioria dos países do G-20. Ainda assim, nenhum dos governos do G-20 está de fato controlando estes setores, especialmente Austrália, EUA, Rússia e Indonésia, que estão ficando para trás. Mas alguns países estão avançando, como o Reino Unido e a França com sua decisão de rapidamente se livrarem das usinas elétricas a carvão e tirar de circulação veículos movidos a combustíveis fósseis.

De acordo com os pesquisadores, os países do G-20 precisam cortar suas emissões pela metade até 2030 se quiserem manter o aquecimento global abaixo do 1,5º Celsius. Mas muitos estão tomando decisões que vão no caminho contrário disso, como o Brasil e as recentes medidas de controle do preço do diesel como resposta à greve dos caminhoneiros que paralisou o país em meados deste ano. Segundo o relatório, os subsídios brasileiros ao setor chegaram a US$ 16 bilhões (cerca de R$ 61 bilhões) em 2016, aproximadamente o dobro do valor dispendido em 2007.

- Em vez de responder à emergência das mudanças climáticas, os países do G-20 continuam a despejar dinheiro em medidas que perturbam o clima, como subsídios para os combustíveis fósseis – destaca Jan Burck, integrante da Germanwatch, organização civil alemã, e outro dos coautores do relatório. - Arábia Saudita, Itália, Austrália e Brasil são os países que mais fornecem estes subsídios em relação ao PIB (Produto Interno Bruto).

Aqui também preocupa a retomada do crescimento do desmatamento, já que as chamadas mudanças no uso da terra são historicamente as principais contribuintes para as emissões de gases-estufa brasileiras. Por outro lado, o país é elogiado por seu grande uso de fontes renováveis de energia, campo em que ainda pode avançar mais. Resta, no entanto, a dúvida se o futuro governo do presidente eleito Jair Bolsonaro vai dar continuidade ao protagonismo brasileiro na luta contra as mudanças climáticas ou, pelo contrário, retirará o país do Acordo de Paris, como já disse que poderia fazer.

- A taxa de desmatamento no Brasil está em alta, e seus subsídios para os combustíveis fósseis aumentando, mas também sobe a proporção de uso de energia renovável, área em que há enormes oportunidades – avalia William Wills, pesquisador do CentroClima, grupo dedicado ao estudo das questões climáticas da Coppe/UFRJ e um dos 14 parceiros internacionais da Climate Transparency. - O Brasil enfrenta um grande risco de impactos negativos do clima que provavelmente vão afetar fortemente a produção de alimentos. Esperamos que o novo presidente mantenha o Brasil na liderança das negociações climáticas e reforce as ações do país de forma a alinhar nossas emissões de gases-estufa ao Acordo de Paris.