Por Paulo Martins, G1 CE


Mensagens foram espalhadas em outdoor localizados em cinco pontos diferentes de Fortaleza — Foto: Muriel Cruz/Divulgação

Outdoors com mensagens que fazem alusão à memória de travestis e transexuais do Ceará foram vistos em algumas das principais avenidas de Fortaleza nesta terça-feira (8). "Procura-sy travestis vivas vivas vivas no estado do Ceará. O tempo e o tecido conjuntivo da vida, nos permitem viver", dizia a frase estampada em um dos painéis localizado na Avenida Washington Soares.

Segundo a historiadora e artista visual Sy Gomes, os outdoors fazem parte da terceira fase de um projeto iniciado ainda em setembro de 2019, quando cursava a disciplina de performance do Instituto de Cultura e Arte da Universidade Federal do Ceará (ICA/UFC). Chamado Panfletário Sy, o projeto questiona a presença da memória travesti da cidade de Fortaleza.

"Os homens brancos têm sua memória representada por meio de nomes de ruas, praças, estátuas e eu, travesti, não queria ser lembrada com bustos, estradas, nada que já tivesse sido utilizado pela memória monumental. Eu queria ser lembrada por aquilo que era mais efêmero e urbano. Aquilo que se esvaziava em poucos segundos, porque na minha cabeça a minha vida tinha essa efemeridade", explica.

A artista reforça ainda que essa efemeridade a que muitas travestis e transexuais estão expostas por causa da violência é traduzida nos painéis temporários dos outdoors urbanos. "Na minha opinião, os outdoors são o que há de mais efêmero em termos de memória. As pessoas lembram que tem aquele outdoor, mas ele só serve ao mercado. Duas semanas depois eles são retirados dali. Isso que me impulsionou ao movimento", conclui.

Além da Av. Washington Soares, as mensagens ficam expostas por cerca de dez dias em outros quatro endereços da capital cearense: Rua Doutor José Lourenço, Av. Godofredo Maciel, Av. Bernardo Manuel e no cruzamento da Av. Visconde do Rio Branco com Rua Clarindo de Queiroz.

Cidadania Cultural e Diversidade

O projeto está contemplado no edital Cidadania Cultural e Diversidade, da Lei Aldir Blanc, da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (Secult). Um pacote de 10 editais com investimento de R$ 21 milhões foi lançado em setembro deste ano para apoiar e incentivar a cultura.

"Os editais referentes à execução da Lei Aldir Blanc do Ceará são importantes para a diversidade cultural, pois ampliam direitos, garantem o acesso à política cultural, à diversidade, aumentando as vozes, as cores, os ritmos, e os modos de se construir a Cultura", informou a pasta.

Mortes de travestis no Ceará

Pelo menos 14 travestis ou transexuais foram mortas no Ceará durante o ano de 2020; seis delas apenas no intervalo de um mês, entre os dias 11 de julho e 10 de agosto. O número já é maior do que o observado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) em todo o ano passado no estado. De janeiro a dezembro de 2019, segundo a entidade, foram 11 homicídios com vítimas transgênero.

De acordo com a ativista da Associação de Travestis do Ceará (Atrac), Yara Canta, “são números que assustam, principalmente, por ter sido em pouco tempo. Em uma semana, três casos. Foi um bombardeio de informação. A gente se sente com medo pela vida de todas nós”.

Na visão da ativista, o poder público não dá devolutivas à população trans porque “além de existir essa transfobia estrutural, não há políticas públicas e nem vontade e preocupação em mudar, nem sequer investigar os casos direito”. Yara lembra ainda que, dos casos aos quais ela teve acesso, apenas o da travesti Dandara dos Santos foi julgado desde 2017.

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